quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

OS PANTEÕES

Ilustração Marco Joel Santos

            E a grande questão da actualidade é a trasladação do meu homónimo rei da bola para o Panteão Nacional. Sim, dizem uns, não dizem os outros e ainda há outros que não dizem nada porque são mudos. E assim discorrem os dias primevos de 2014, para alívio do governo da República, que vê assim as atenções virarem-se para aquilo que realmente (não) interessa.
            A questão é tão absurda que merece alguma reflexão, de facto. O homem ainda nem tem os torrões consolidados em cima da urna e já querem mudá-lo de sítio. E o Panteão parece ser o destino, mais tarde ou mais cedo, e por muito que a oxigenada cabeça de preenchimento duvidoso que preside ao para lamento deste país diga que não há dinheiro para a operação.
            A verdade é que a maior parte das pessoas que têm falado sobre o assunto nem sequer alguma vez visitou, viu em postal ou tinha ouvido falar do Panteão Nacional. Na verdade, é uma igreja, a célebre Igreja de S. Engrácia, e por este nome já todos os portugueses ouviram falar da famosa obra seiscentista na cidade de Lisboa, já que foi iniciada em 1682. Mas só foi concluída quase 300 anos depois, o que deu origem ao famoso epíteto de qualquer obra que se atrase no tempo de “obra de Santa Engrácia”.
            Por outro lado, as pessoas julgam que apenas os grandes heróis da nação portuguesa estão tumulados no Panteão Nacional. Mentira. Os grandes heróis nacionais não estão no Panteão, e eu até acho que não estão porque não querem. Alguém sabe, então, quem está tumulado em Santa Engrácia? Aí vai a lista:
  • Almeida Garret – escritor que escrevia português macarrónico, ao ponto de nem ele, por vezes, entender o que tinha escrito;
  • Amália Rodrigues – dispensa apresentações. Tinha uma goela do catano e era fadista;
  • Aquilino Ribeiro – escritor e regicida;
  • Guerra Junqueiro – escritor de cenas e tal, que alguns ainda lêem;
  • Humberto Delgado – candidato a herói nacional, assassinado pela PIDE de Salazar;
  • João de Deus – escritor, sabe-se lá o que escreveu…
  • Manuel de Arriaga – presidente da República da I República, o período mais conturbado da nossa história contemporânea;
  • Óscar Carmona – presidente da República responsável pelo aparecimento do Estado Novo e depois da implantação do mesmo, até 1951;
  • Sidónio Pais – presidente da República e ditador da I República, autor do período de ditadura chamado “sidonismo”;
  • Teófilo Braga – o mesmo que Manuel Arriaga;
Ora, se alguns são heróis (provavelmente Humberto Delgado e pouco mais), a verdade é que o Panteão Nacional está recheado de gente pouco recomendável ou pouco significativa. A pessoa mais conhecida será mesmo Amália – e era fadista.
Outra coisa que pouca ou nenhuma pessoa que tem falado deste assunto parece conhecer é que não existe um Panteão Nacional, mas sim dois Panteões Nacionais. E estes são os assim designados. Como verão, até há mais panteões nacionais por aí espalhados. Mas oficialmente, há de facto dois Panteões Nacionais. Um é Santa Engrácia, como já foi referido. Será que alguém adivinha o outro? Ora, no outro Panteão Nacional estão de facto heróis nacionais, homens que a História de Portugal nunca mais esquecerá (ao contrário de João de Deus, por exemplo…). E que nomes lá podemos encontrar nos túmulos? Que homens assim tão importantes lá estarão sepultados? Bem, os nomes de D. Afonso Henriques e D. Sancho I deve bastar para perceber porque é que o local é Panteão Nacional. Alguém sabe onde fica? Pois, bem me parecia…
Um outro local que é um verdadeiro panteão nacional, e que devia – esse sim – ser assim designado oficialmente é o Mosteiro de Santa Maria da Vitória. Quem está lá sepultado? Para além do nosso mais recente santo, o Condestável, basta que esteja lá toda a Ínclita Geração, incluindo o nosso mais poderoso soberano da História, D. João II. É mais conhecido por Batalha. O Mosteiro de Santa Maria de Belém tem sepultado o nosso maior herói navegante: Vasco da Gama. É mais um panteão nacional. E mais há por esse país espalhados. Locais onde verdadeiros heróis nacionais estão sepultados e são invocados e relembrados – celebrados. 
Agora falando a sério, acham que o Eusébio ia querer estar ao lado de Carmona? Eu não quereria, com certeza. Até porque ainda estou vivo…


4 comentários:

  1. Pois...

    Não me surpreendo muito com esta mania de querer levar o homem para o Panteão!

    Surpreende-me que não queiram levar para lá o Aristides Sousa Mendes, por exemplo...
    ...mas é mais importante dar xutos numa bola do que salvar vidas...

    :)

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    1. No Panteão ele estaria sub-representado. É um sítio mal frequentado.

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  2. Ideossincrasias à portuguesa..
    Um dia, começam a "cromar" o pessoal e a espalhar as estátuas pelos locais públicos!!

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    1. Não é má ideia. Lembra-te que as sepulturas reais têm as estátuas dos Reis em cima...

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