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A 4L rolava pela estrada sem entraves. O dia estava bonito mas frio. A despedida de terras espanholas estava para breve. Ahmed conduzia despreocupadamente e ao seu lado seguia Ali, sonolento e chocalhando ao ritmo do velho veículo de matrícula francesa.
- Num sei porqué que tínhamos de bir numa 4L! Num arranjaram melhor lá na sede? – perguntou Ali, visivelmente desconfortável com as costuras das calças Levi’s nas virilhas.
- Oh pá, lá tás tu cum essas merdas! – Ahmed estava irritado – já te expliquei, c@r£hº! Portugal está em crise, é melhor a gente num chamarmos a atençon da bófia, e nada melhor que uma 4L a cair de podre para andar à bontade no meio dos gajos!
- Oub’lá, aton porqué que estamos a bestir roupas caras, Levi’s e o c@r@£hº? Eles num ton em crise?
- Fºd@-$€, qués um cepo do c@r@£hº!! Aton num bês, meu murcon, cagente estudou os gajos? Eles memo em crise usam sempre merdas que num pode! - Aton e o carro, canudo? Num debia ser melhor, se eles usam merdas que num pode pagar?
- Aton tu num bês, seu cagon, que comprar roupas e merdas é mais fácil que comprar carros? Os gajos devem andar todos bem bestidos mas em 4Ls, pá!
- Olha, bem ali um carro com matrícula portuguesa! Bê lá a marca!!
- É um BMW… Mas este deve ser dirigente desportivo ou o c@r@£hº...
- Olha bem outro atrás! Bê lá a marca, ò murcon!
- É um Mercedes… Debe ser jogador do esférico…
- E aquele que aí bem, e até é uma gaja sem burka a conduzir??
- Está bem, fºd@-$€, já bi, é um Aude. Debe ser mulher do outro que passou!
- De qual dos dois?
- Sim, dos dois!
Uma placa divisava-se ao longe. Estava nela escrita a palavra Portugal, com umas estrelinhas à volta. Passaram a placa e meio quilómetro à frente, à entrada da aldeia perdida no meio dos montes, um jipe da GNR estava parado na berma. Um guarda ergueu a mão e pôs-se no meio da estrada, fazendo sinal à velha 4L para encostar.
- Bom dia, xenhor condutor – o guarda fez a continência – pode parar o motor da xua viatura, por favor? Gostava de ver o xeus documentos e os da viatura, por favor.
Ahmed rebuscou na sua velha carteira de pele de camelo australiano pelos documentos, ao mesmo tempo que ia sorrindo para o guarda, que mantinha uma posse impassível por detrás dos óculos Ray Ban. Assim que os encontrou, deu-os para a mão do guarda. Este deu uma volta ao veículo, olhou atentamente para os selos expostos no pára-brisas, e voltou para junto de Ahmed, que se sentia cada vez mais em pânico.
- Ora, Xenhor Ahmed Dióspiro, temos aqui um problema. A xua viatura tem matrícula francesa e não traje ali no vidro o selo de inspexão periódica obrigatória.
- Mas, ò senhor guarda, eu tenho aqui o comprobatibo da inspecçon feita ali em Salamanca, só num tibe tempo para pôr o selo ali no bidro. Num tenho mais daquelas saquetas, sabe? – e Ahmed deu ao guarda a declaração falsificada.
- Ah bom! Axim é diferente e não xeja por ixo. Pegue lá uma das noxas! Mas temos dois problemas, então! Uma viatura franxeja, um xelo espanhol, uma xaqueta portugueja e dois ocupantes marroquinos!
- Marroquinos, senhor guarda?? Pelo amor de A… Deus, aton nós somos lá marroquinos? A gente somos finlandeses, num se bê pela cor da fuça? A gente bem em passeio por essa Europa fora, e até bínhamos no Inter Rail, mas depois aquilo abariou em França e a gente alugamos esta biatura.
- Finlandejes em paxeio? É o que dije o xeu BI, mas isto é esquijito, porque ainda a xemana paxada houve dois marroquinos a bender tapetes lá na terra e eram muito parexidos com voxemexês…
- Ò senhor guarda, se calhar eram finlandeses, olhe qu’os tapetes finlandeses são muito bons, assim em pele de urso polar e tal. Eu próprio tenho uns cinco lá em casa…
- Pois, xe calhar eram, não xei… Olhe, vai ter de me dar xem aeurios, por favor.
- Aton, mas ò senhor guarda, mas eu tou a ser multado? Porquê? Binha em excesso de bolina? Ou falta algum documento?
- Nada dixo, é para pagar o Dispojitivo de Pagamento de Portages, eu por acajo até tenho aqui uns quantos e xão muito jeitojos, axim num tom ajul bebé, ou então também tem este rojinha que também é muito lindo.
- Ò senhor guarda, mas isso dos coisos dos chips num eram só setenta e cinco? Olhe que eu até penso que li alguma coisa sobre isso…
- Pois, mas leu mal. O xenhor condutor está por acajo a inxinuar que o agente da autoridade perante xi está a pedir um xuborno?
- Não, ò senhor guarda, pelo amor de A… Deus! Nada disso!
- Então proxeda ao pagamento, por favor. Não… nada dixo… ixo, ixo, em notas de auerio, por favor. Não temos o terminal a funxionar. E vai-me desculpar, mas esquexi-me do livro de rexibos… Muito obrigado – disse o guarda, guardando o dinheiro no bolso das calças – e pode xeguir, xenhor condutor!
- Então e o dispositibo?
- É virtual, o xenhor depois vai a uma payshop e dá a matrícula e paga.
- Mas o senhor guarda até me disse que eram azuis bebé e rosinha e o camandro!
- Xim, pois, pode imaginar a cor que quijer, é a vantagem de xer virtual. E pode ir à xua vida, lá para a Ximeira da Nato e o catano, faxa uma boa viagem!
- Mas como é que o senhor guarda sabe que eu bou para a Cimeira da Nato, canudo?
- Ora, numa 4L, ou é terrorista ou marroquino a vender tapetes, voxemexê dexida-xe lá! E xendo um terrorista finlandês, com xerteja os meus colegas da capital limpam-lhe o xebo antes de dijer um pio. Xe foxem árabes ou quê… E já agora, o que quer dijer Diójpiro em finlandês? Ou era o pai do xenhor que não gostava de xi à naxenxa?