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Escolhi aquela faixa do meio. E enquanto tirava o cartão para pagar a portagem, e lhe juntava o ticket, constatava que já há algum tempo não passava pela saída da A4 em Amarante.
Fiquei algo surpreso porque a portagem ainda está a ser atendida por portageiros.
-Boa noite - saudei, reparando que lá estava o senhor de sempre, aquele que sempre conheci naquela cabine daquela portagem. Reparei que não estava com grande humor.
Boa noite - respondeu, quase a contragosto, passando o ticket e, a seguir, o cartão.
-Então não vão pôr aqui as maquinetas? - insisti eu, que normalmente dou sempre uma palavra àquele portageiro, enquanto colocava o cartão e o recibo no banco do passageiro.
-Está a ver aqueles tubos vermelhos ali à frente?
-Sim - respondi, reparando nuns pequenos tubos vermelhos que emergiam do solo à frente da cabina.
-É para as instalar...
-Está a brincar comigo!
-Não estou, não... - e reparei que o homem estava quase a chorar - vinte e cinco anos da minha vida, passei-os aqui dentro, aqui e na outra lá em baixo, quando existia. Tenho cinquenta anos. Tenho mulher e dois filhos. Vou a caminho de quê, agora?
-Vai ver que ainda alguém as vai encher de chumbo, quando começar a caça!
-Não duvide - o homem esboçou um discreto sorriso, muito breve. Voltou rapidamente a uma cara desolada e rematou:
-Mas nessa altura já vai ser tarde para mim. E para os meus...
Engrenei a primeira, lentamente. Não estava ninguém atrás de mim. Gostava de ter conversado mais com aquele portageiro que conheço há tantos anos.
-Boa sorte - foi a única coisa que me saiu.
-Obrigado e boa viagem! Eu é que já não sei para onde vou...
E como este relato há tantos idênticos por esse País fora, e o que mais me dói é que vão ser mais, muitos mais.
ResponderEliminarQuem não conhece estórias como a deste portageiro?
Que se diz a uma pessoa nesta situação?
E quando são pessoas chegadas a estarem numa situação idêntica?
Todos os dias me entristeço cada vez mais com estórias assim e outras piores.
É de facto, lamentável, ainda para mais sabendo que a BRISA e outras concessionárias estão a investir noutros países e têm tido bons resultados económicos.
ResponderEliminarNo meu caso, também suspeito que qualquer dia um robot vai substituir-me no meu trabalho. Apenas sinto o conforto de saber que eu sou muito mais bonito e atraente!
Muito triste. Mesmo muito triste. E aquele senhor vai passar o resto da idade até à reforma como desempregado, a ser chamado ao centro de emprego para prestar provas, a fazer cursos para entreter, a julgar-se inútil, só porque esta sociedade não tem lugar para pessoas com a idade dele e com poucas qualificações. Há tanta coisa errada com a nossa sociedade.
ResponderEliminara procura do lucro pelas grandes empresas está cada vez mais ambiciosa.
ResponderEliminarPronúncia, e parece-me que estamos apenas no início...
ResponderEliminarDylan, a redução de custos apenas contempla números, e as empresas, na sua maioria, vêm, como sabemos, nas pessoas um número. Nada mais.
ResponderEliminarSara, é um facto que há muita coisa errada. Mas enquanto se continuar a pensar que o que está errado são as pessoas...
ResponderEliminarDaniel, aí reside a raiz do problema. É pena que muitos apenas vejam os lucros à frente e nada mais. Mais atroz ainda se torna esta perspectiva quando toda a sociedade está para aí virada.
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