Já sei que o Júlio César foi expulso e o Roberto defendeu o penalti. Oxalá se tenha recomposto. Mas este post é sobre a expulsão de ciganos da França. Lamento desapontar.
E este é um problema com repercussões bem mais graves que o do Roberto. Digo eu, que percebo pouco destas coisas. Não vou contar o que está a ser feito, isso já toda a gente sabe. Vou dar uma opinião e tentar fundamentá-la, não apenas sobre o facto em si, mas também sobre as condições que o rodeiam.
O problema não é novo e não tem solução fácil. Se, por um lado, os ciganos búlgaros e romenos são cidadãos europeus, aos quais se garante a liberdade de movimento dentro do espaço Schengen, por outro, há que tentar verificar o que de facto estão estas pessoas a fazer no solo francês. Ou seja, se trabalham, se contribuem para a economia. Parte-se do princípio de que não, até porque, obviamente, são ciganos, e os ciganos, na opinião pressuposta dos restantes cidadãos, não contribuem com nada para a sociedade. Ora, a verdade é que se sabe que estas pessoas viviam em condições difíceis, em acampamentos ou bairros de lata. Não se sabe se trabalhavam ou procuravam trabalho ou não. Como há exemplos de comunidades ciganas que não o fazem, parte-se do princípio que não o faziam e está o caso resolvido. Outra das "informações" veiculadas por muita gente com muitos pressupostos e poucos factos é que estariam a receber verbas do estado francês, o que, afinal, não era verdade. Só o foi quando foram expulsos.
Caso resolvido? Mas qual caso? O caso Sarkozy, o caso eleições francesas. Notoriamente, a França tem uma população das mais xenófobas da Europa, e 65% dessa população veria com bons olhos uma expulsão de ciganos. Mas não só. No caso francês, em que distúrbios raciais se têm vindo a multiplicar, é crucial para o presidente Sarkozy demonstrar que tem a segurança controlada. Nas eleições, em países multirraciais, a opção pela segurança por parte dos políticos é sempre a mais fácil, particularmente políticos demagógicos e pouco competentes, como é o caso de Sarkozy. Não que seja o único, e que a questão da segurança não seja efectivamente importante, como alguns "iluminados" da esquerda portuguesa preconizam. No reverso da medalha, temos as nulidades demagógicas de direita a reclamar estado policial. Nem oito nem oitenta, diria eu.
Depois há as reacções. E algumas são humorísticas, e provocam respostas também elas humorísticas. Pelo menos parecem, mas não são. Na verdade, não são. A reacção da ONU foi a esperada: está mal e tal, mas vejam lá se param, que a gente não faz nada na mesma, o que aliás, estamos já habituados a fazer. Daqui nada de novo, até porque a ONU está longe de saber qual a realidade social francesa e por isso não quer envolver-se num caso doméstico à França e Europa. Mas a UE optou por caminho similar. Depois o Vaticano, que compara a expulsão dos ciganos ao Holocausto da 2ªGuerra Mundial. Um exagero óbvio, senão mesmo uma expressão totalmente descabida. A resposta dos israelitas não se fez esperar e fizeram notar ao Vaticano que a expressão é totalmente descabida de facto. Na minha opinião, é de facto. Mas há dois factos que têm de se entender e que muitos esquecem facilmente. Primeiro, qualquer acção xenófoba é encarada pela Igreja como um novo Holocausto. Depois as coisas serenam e o novo holocausto passa, e as pessoas ficam com a sensação que o verdadeiro Holocausto não foi assim tão mau. Porque estaria, então, a Igreja interessada no branqueamento do Holocausto? Porque, obviamente, foi parte integrante e executante do mesmo, no tempo do agora beatificado Papa Pio XII, que patrocinou activamente o Holocausto dos balcãs, em que centenas de milhar de sérvios foram chacinados por croatas e bósnios, com a ajuda de alemães, alemães que obtiveram a sua fuga através dos corredores do Vaticano após a queda de Berlim, às mãos do Exército Vermelho. Portanto, tudo o que diminua o horror do Holocausto é bom para o Vaticano e para a canonização de um dos maiores genocidas da História Moderna, Pio XII.
Ao contrário, os israelitas não admitem que algo possa ser comparado com o seu Holocausto. E, na verdade, e até agora, nada pode ser comparado ao Holocausto, a não ser talvez o genocídio do Ruanda. Esta é a realidade. E é uma realidade tristemente conveniente, nos dias de hoje, em que os israelitas aplicam políticas muito semelhantes às de Hitler em Varsóvia, por exemplo. Por isso podemos esperar sempre reacções extremadas por parte de israelitas quando se põe em causa o seu imenso sofrimento, e com isso, e por arrastamento, se pode pôr a nu o sofrimento que agora infligem a outros. No fundo, é simples.
Voltando aos ciganos, é premente resolver o problema. E ao escrevermos "problema", estamos já a assumir que a presença destas pessoas seja um problema, o que não deixa de ser ironicamente xenófobo. Para além disso, na qualidade de cidadãos europeus aos quais foram restringidos movimentos dentro do espaço europeu, corre-se o risco de contradizer o fundamento mais básico da Europa moderna, o da livre circulação de bens e pessoas. Ao mesmo tempo, convém não esquecer que o rodopio de subsídios e programas sociais europeus, particularmente nos países do sul, fez criar a ideia de se poder viver sem trabalhar, à custa do estado, ideia que mais se agudiza em sociedades xenófobas, em que as oportunidades de emprego não são obviamente igualmente acessíveis às diferentes etnias. É um equilíbrio precário, em que o preconceito da maioria tem, obviamente, mais peso.
Convém não esquecer, contudo, que todas as operações de extermínio começaram, historicamente, de forma parecida com a que Sarkozy agora adoptou. Não que resulte no mesmo, e esperemos que não. Para já, nada foi excessivamente grave. As pessoas em causa regressaram a casa e pouco mais se sabe. Ninguém morreu. Mas no início, nenhum Azteca morreu às mãos de Cortez, nenhum índio morreu às mãos de colonos do Oeste, nenhum judeu morreu às mãos de Hitler ou nenhum tibetano morreu às mãos de Mao. Foram todos convidados, gentilmente, a deslocarem-se ou a aceitarem a invasão. Depois as coisas deterioraram-se. Este não parece ser o caso, mas é o único ponto em que a Igreja parece ter algum contacto com a realidade.
Soluções? A expulsão? É a mais fácil, obviamente. E se estas pessoas devem ser integradas no espaço europeu, bem podem ser integradas no seu país de origem, e aí concordo que seja esse país a ser onerado com os custos dessa integração. Contudo, não esquecer o essencial: há etnias que não só não contribuem em nada para com a economia europeia como a prejudicam de forma irreversível, como é o caso dos chineses, que estão a destruir paulatinamente toda a economia ocidental, e nada lhes acontece. Por isso, expulsar os mais fracos, independentemente de ser legal ou não, demonstra apenas demagogia e uma atroz falta de vontade de lutar contra as reais causas da crise europeia. Pode-se a árvore, não se corte a raiz, e no ano seguinte ela crescerá novamente.
Outra coisa que não devemos esquecer é que a França, após a 2ªGuerra Mundial, abriu os braços a todo o tipo de emigração, para a reconstrução. Não interessava se eram emigrantes legais ou não, interessava que fossem mão-de-obra barata. Obviamente, o país (e não só a França) já não precisa de emigrantes, antes pelo contrário. Aqueles que eram tolerados por serem necessários, hoje são vistos como corpos estranhos à sociedade francesa. E apenas em dois sítios são considerados iguais: na selecção francesa, que está recheada de emigrantes de segunda geração, e no Eliseu, onde mora um presidente, ele próprio filho de emigrante ilegal. Há ironias do catano.
Tudo para concluir: há pessoas interessadas em fazer dos ciganos exemplo para ganhar votos, e do outro lado, há pessoas interessadas em fazer dos ciganos exemplo para fazer que quem quer ganhar votos na realidade os perca. E, pelo menos para já, é a tal tempestade num copo sem água. Trovoada seca. Oxalá não venha a chover em consequência dos joguinhos da direita demagógica e populista e da extrema esquerda pseudo-humanista.
Foto JN