O jornal Público noticia que os jovens
médicos estão preocupados com o futuro e começam a equacionar emigrar.
Sou do tempo em que a reverência para
com o Sr. Dr. era quase caricatural. Ia-se ao Sr. Dr. e não ao médico. Ia-se e
entrava-se com uma postura humilde à espera de trazer uma prescrição para curar
uma maleita que não nos era explicada dada a ignorância óbvia que o Sr. Dr.
entendia termos. Ou então, a explicação era dada em termos tão técnicos que vínhamos
para casa ainda mais convencidos que aquilo sim, era um Dr.! Então, na consulta
seguinte, levava-se alguma coisinha, um agrado, ao Sr.Dr., ainda que se pagasse
a consulta e se oleassem as mãos da funcionária que era muito simpática e nos “arranjava”
consulta mais rapidamente.
Os tempos mudaram mas os jovens, certamente
não por acaso, enchem as turmas do ensino secundário de Ciências e Tecnologias,
ainda que não o façam por vocação, na esperança de entrarem em Medicina. Alguns
confessam que queriam ser jornalistas ou professores, outros que estão a
cumprir o sonho dos pais e não o deles, outros, ainda, que acham que “os
médicos é que ganham dinheiro”!
Este mito não existe apenas porque nós o
criámos, existe também porque muitos médicos para ele contribuíram, com
atitudes de superioridade e com os elevados honorários que cobram.
Conheço, felizmente, médicos que em nada
se enquadram neste retrato mas é também certo que houve uma maioria que nunca
lutou ao lado das outras classes profissionais em momentos políticos cruciais e
que só agora, quando o seu reduto de privilégio é ameaçado, começa a
manifestar-se.
Como os médicos, outras classes se
alhearam, olhando apenas para o próprio umbigo. No entanto, a crise não
distingue profissões (político não é profissão, no meu entender, é tacho) e talvez tenha
chegado o momento de agir como cidadãos comuns, com interesses e objectivos
comuns!
Parece que os choques estão na moda, mas o que este país precisa não é de um "choque tecnológico/fiscal/de empreendedorismo/etc."... o que este País precisa é de um valente choque de cidadania, sem isso, vamos continuar a levar choques, mas... eléctricos.
ResponderEliminarNo fundo, não deixa de ser normal. Esta situação já se repetiu muitas vezes neste país. Lembro-me que ainda há 4 anos, quando toda a função pública começou a levar na tarraqueta, houve alguns que pensaram que as leis não os afectariam. Depois, deram-se conta que afinal também eram para eles e entraram em guerra com o Ministério da Educação... Mas quando a FP saiu para a rua para se manifestar, ninguém viu professores, por exemplo, na rua...
ResponderEliminarPois é, Pronúncia, não vamos lá com choquezinhos!!
ResponderEliminarCirrus: Não poderia tê-lo dito melhor! Aliás, os professores só marcharam em força porque os instalados se sentiram atacados. Perante uma mísera oferta de um acordo fantasma no qual se eliminava a categoria de professor titular e se prometia mais um escalão, logo se enfiaram nas escolas a fazer tudo aquilo que contestavam antes!
ResponderEliminarConheço de muito perto um médico que, ao longo do tempo em que pôde trabalhar, viveu para os doentes e não para a carreira.
ResponderEliminarTentou trabalhar como os seus pares no sector publico acumulando com o privado mas não gostou da experiência, o que o levou a aderir à exclusividade por saber que só assim, trabalhando apenas no hospital, teria condições de exercer a medicina com qualidade.
Chegou a ocupar um cargo na direção do hospital onde trabalhava... mas arranjou com isso inimigos porque tentou lutar com os vícios e abusos instalados, obrigando, por exemplo, certos serviços a trabalhar de tarde para dar uma melhor assistência aos utentes e conseguir uma melhor rentabilização dos serviços.
Mas era um Dom Quixote a lutar contra moínhos de vento...
PS: desta vez o link funcionou :)
ResponderEliminarPois é, Orquídea, os exemplos bons parecem desvanecer-se perante um muro de oposição e indiferença...
ResponderEliminarComo em tudo neste país, não faltam só bons políticos, também faltam bons cidadãos.
ResponderEliminarHá falta de cidadania sim, e não é só por parte dos médicos ou de qualquer outra profissão, pois acho que não há profissões que não sabem o que é cidadania e a luta por um bem comum, há sim pessoas que não o sabem ou não querem saber.
Bom texto :)
A crise toca a todos...médicos, advogados e dr's semelhantes são afectados como o comum mortal.
ResponderEliminarNão são deuses....já lá vai o tempo em que eram considerados como tal.