quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

O CAVALO DO MAOMÉ VOAVA

Ilustração Marco Joel Santos

            Decorrendo do atentado ao Charlie Hebdo, nunca por nunca se terá falado tanto de religião como nestes últimos tempos. Exceptuando talvez a Idade Média, bem entendido. Interesso-me desde há muito pelo fenómeno religioso, o que me levou a estudar o assunto e concluir a licenciatura em História com o “major” em Religião e Cultura. E se há quem não entenda a relação entre as duas vertentes, então não vive neste mundo.
            Há quem diga que tudo o que se faz é política. Eu digo que se faz por causa da religião. Ou ausência dela, o que estranhamente se assemelha cada vez mais a uma nova religião que, antes de atingir o zénite, já decaiu. Vivemos na nova era religiosa, a era das experiências religiosas pessoais, a era das fés não organizadas que tanto horroriza tanto os ateus como os religiosos. Contudo, o meu interesse pela religião é puramente académico e de alguma forma social, pois rejeito a religião organizada e sinceramente não quero gastar dinheiro em drogas de segunda para ter uma epifania religiosa universo-pessoal ao estilo americano nativo.
            Tendo estas premissas desde já aclaradas, escrevo agora sobre a religião organizada. As pessoas são livres, nesta sociedade a que convencionamos chamar “ocidental”, mas que no fundo não passa da condescendente, vetusta e levemente passada de prazo cultura europeia de cariz judaico-cristão, de professar a religião que muito bem entenderem. Para os agnósticos, laicos ou ateus, seja de que forma se refiram aos que se estão defecando para as religiões, no entanto, não deixa de ser estranha a experiência religiosa, particularmente entender os mitos cosmológicos ou os factos fundadores da Fé.
            A nossa sociedade europeia é, como já referi, de cariz judaico-cristão. Convenhamos que, sendo provavelmente a religião mais numerosa do mundo inteiro, desde que os chineses não se tornem hindus ou os indianos se tornem confucionistas, é também a religião ou continuum religioso mais difícil de compreender. Isto porque acreditar que uma senhora engravidou num sonho de um anjinho e se manteve virgem, e com isto tudo o marido ainda aguentou a família, que uma estrelinha no céu estava por cima do local onde estava o puto daí nascido, puto esse que depois de inspirar Marx e Engels se deixou crucificar para ressuscitar ao terceiro dia e melhor ainda, ascender aos céus quarenta dias depois… Nada mau.
            É verdade que muitas figuras fundadoras de diversas religiões são figuras reais da História. Buda, Jina, Confúcio, Zoroastro, Abraão, José (não o pai de Jesus) e provavelmente Moisés, ou Maomé, por exemplo, são pessoas que existiram efectivamente. Já Cristo, apesar das imensas pressões para que se diga o contrário, não tem uma existência documentada historicamente, a não ser a palavra de honra de uns três ou quatro supostos apóstolos cujos testemunhos foram transcritos entre cem a trezentos anos depois da suposta crucificação. Método de execução que, ao contrário do que se quer fazer crer, era extremamente comum nas províncias romanas e mesmo no Lácio e Roma. A beleza do mito cristão é, no entanto, indescritivelmente prática. Como não há registos independentes que documentem a existência de Cristo, a veracidade da história provar-se-ia se descobríssemos um corpo. Mas o facto de ninguém ter descoberto um corpo prova que a história é verdadeira, pois Cristo subiu aos céus com o corpo. É a chamada pescadinha de rabo no corpo.
            O islamismo aceita tudo o que vem do judaísmo e do cristianismo, mas acrescenta-lhe Maomé e os seus delírios esquizofrénicos. Bem, assim seriam consideradas as famosas conversas com Deus, ou Allah, assim chamado nos tempos idos de Moisés, quando Deus se terá anunciado ao profeta como “Eu sou Aquele que é”, ou seja, Allah. Como todos somos porque somos o que somos, Deus assume aqui a sua faceta de La Palisse em grande estilo de sarça ardente e voz grossa. Maomé sonhava tantas vezes com Allah que temo que o pobre coitado tenha inventado a SPA e os direitos de autor em consequência. E Maomé, apesar de ser uma pessoa efectivamente real, pregava a paz mas fazia a guerra e foi mais um que subiu aos céus com corpo e tudo, e se Cristo o teria feito em Jerusalém, Maomé não era homem para menos e fez o mesmo no mesmo local. Apesar de ter morrido em Medina, uns bons kms a sul.
            O islamismo prega a paz, mas não é menos verdade que em cem anos conquistou à lei da espada meio mundo conhecido. E se é bem verdade que períodos houve em que a liberdade religiosa era garantida pelo Califado, e não será demais lembrar os tempos da Catedocracia judaica, de Maimónides e das Academias, precisamente sediadas nas Babilónias – Bagdade, sede do Califado e Cairo, um pólo islâmico importante, onde fixou capital, mais tarde, o próprio Saladino, também é verdade que a tradição oral veio endurecer paulatinamente as posições políticas do Islão, e a imposição islâmica não é nenhuma ficção na actualidade.
            Ao patrocinarmos (Ocidente) o abate dos regimes laicos de alguns países islâmicos, como a Líbia, a Tunísia, o Egipto e a Síria, antes já precedidos por Líbano e Turquia, patrocinamos igualmente a prévia fuga de clérigos radicais destes países, onde eram perseguidos ou ignorados (para eles é igualmente atroz) para a tal Europa cândida e multiculturalista, tão segura da sua identidade que ingenuamente recebeu todos estes asilados políticos que subterraneamente exercem a sua influência junto das comunidades emigrantes. Ao mesmo tempo, com a eclosão da Primavera Árabe, que na realidade não passou de um gigantesco conjunto de golpes de Estado perpetrados pelo tal Islão radical, deixamos que se instalassem no poder desses países os tão famigerados fundamentalistas. Com os resultados óbvios, como se vê pelo Estado Islâmico.
            A verdade é que todos dizem que não devemos confundir o fundamentalismo com o radicalismo, não devemos confundir islâmicos com islamitas. Obviamente, o politicamente correcto que ninguém em seu perfeito juízo pensa e muito menos pratica. As Cruzadas não foram feitas por todos os cristãos, mas foram feitas pelos Cristãos. Os judeus europeus não foram aniquilados por todos os alemães, mas foram sujeitos ao holocausto pelos Alemães. A Ibéria não foi invadida por todos os árabes, mas foi invadida pelos Árabes. Os arménios não foram massacrados por todos os turcos, mas foram-no pelos Turcos. Os sérvios não foram aniquilados por todos os croatas, mas foram aniquilados pelos Croatas. Por isso, é ingénuo quem diz que isto não é uma guerra motivada pela religião, ou pelo choque de culturas, porque é. E não tenham dúvidas que provavelmente, em caso de guerra aberta, as populações seguem quem conhecem, não seguem os inimigos do outro lado da fronteira.
            Quanto ao Charlie Hebdo, é um pasquim de extrema-direita que nunca me foi particularmente simpático. Não me chocou a reacção, chocou-me a execução. Eu não sou Charlie Hebdo, porque sou pela liberdade de expressão, e liberdade de expressão é dizer o que se passa, no caso da imprensa, em todas as direcções. Quando é só numa, além de tudo, é monótono.

            Por fim, a figura ou símbolo de Maomé inspira-me, como a de Cristo ou Buda, todo o respeito, apesar das brincadeiras acima retratadas. Mas estou-me literalmente cagando para o que pensam os islâmicos ou islamitas ou o que quiserem chamar a parte da sociedade dos países islâmicos, por quem tenho uma enorme ternura e afecto, acerca do seu sagrado Maomé, e eles deviam estar a cagar-se para o que eu penso – mas não estão. Para mim é apenas mais uma figura histórica, o primeiro Califa que não se sabe muito bem em que genro delegou o poder à hora da morte – e possivelmente antes do delírio final da elevação do corpo aos céus e da fantástica viagem de Medina a Jerusalém num cavalo voador que lerpou depois de lá chegar, uma história inspiradora (porra, nós também temos o Adamastor e o D.Sebastião). Naquele tempo, está já provado que o ópio era da pesada e não devia ser fumado conjuntamente com o consumo de bebidas alcoólicas…

5 comentários:

  1. ...e não só o ópio...

    ...os gajos tinham um Haxixe que era do baril!

    Curiosamente, proibiram isso tudo...
    ...mas continuam a produzir somente para exportação!

    (todos os infiéis devem ser convertidos e seguir a lei do islão, pelo que as drogas são extritamente proíbidas, mas enquanto não se convertem droguem-se para nos financiarem as guerras que fazemos contra eles para os poder converter...)

    :)

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    1. Curiosamente, não. Continuam a fumar haxixe como se não houvesse amanhã...

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    2. E haverá (amanhã)?

      :)

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  2. Meu caro Cirrus,
    Ficou agoniado por ver o vídeo com a execução da mulher? Ou como aquilo não encaixa na «narrativa» resolveu aplicar o lápis encarnado? Olhe tome lá mais um vídeo sobre a religião da paz:
    https://www.youtube.com/watch?v=RDxqrSeYgtU
    A propósito: se esta sociedade lhe é assim tão insuportável já pensou arrumar os tarecos e ir até Marrocos? Para aqui continuar, com o mal que diz, é preciso ser muito masoquista.

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    1. Caro José José, vejo que já não é anónimo cobarde, é apenas um cobarde anónimo.Esconde-se atrás desse nome falso porquê? Porque tem problemas com a justiça por agressão de mulheres? Foi por eu ter atacado a sua actividade extra-curricular de boxe na esposa, comparando-o aos canalhas do Estado Islâmico, que ficou nesse estado? Ou já estava assim, desde que a sua mulher lhe pôs os palitos, farta de agressões? Ainda não percebi bem.
      Ora, por partes: eu NUNCA defendi o Estado Islâmico, nem sei porque ficou com essa impressão, a não ser pelas razões que sugiro acima. Evidentemente que o seu juízo e capacidade de compreensão de um texto escrito podem estar toldados pelos problemas domésticos, e penso que talvez esta seja a melhor explicação, não quero acreditar que a sua compreensão de um texto escrito esteja ao nível da de um chimpazé.
      Segundo, o blog é meu e dele faço o que entendo. Não sou obrigado a aceitar mensagens de cobardes que se escondem atrás do anonimato ou de nomes falsos como o que usa agora. Por isso, estou-me literalmente defecando para isso.
      Terceiro, critico a sociedade ocidental como critico todas as outras, e não deve ser difícil ver isso em outros posts do blog. Já sei que o post em que o atingi, inadvertidamente, no seu âmago, lhe chamou mais a atenção, mas não podia adivinhar que o meu amigo José José é um agressor de mulheres, ou podia? Assim sendo, sim, vou muitas vezes a Marrocos e a outros países de cultura muçulmana, sempre fui e nunca tive problemas. Mas para quem vive num continente onde grassaram as maiores atrocidades da História Humana, o amigo José José, apesar de agressor de mulheres, está muito confiante... Vá pensando para onde fugir se houver uma terceira guerra continental. Talvez Marrocos lhe pareça uma excelente ideia.
      Quarto, deixe lá de bater em mulheres indefesas e pegue em armas e vá combater o Estado Islâmico, parece-me ser enérgico o suficiente para isso... Ou será que tem medo, e só sabe bater em mulheres indefesas?...
      Quinto: incrível com eu, num dos textos que tanto criticou, ter dito que o Islão se intitula religião da paz mas se expandiu pela espada, e vir para aqui com esta conversa. O senhor tem graves problemas psicológicos. Mas também, para agressor de mulheres... é normal.
      Sexto: Passe bem, lembre-se sempre que os outros não são obrigados a aturá-lo. Tal como não é obrigado a aturar-me. Se discorda do que eu escrevo, escreva a sua opinião de forma cordata e educada, e aí poderemos discutir qualquer questão. Ah, e deixe de se esconder atrás de anonimatos e nomes falsos. Eu estou bem à vista, e não são pessoas como o meu amigo que metem medo. Também é verdade que não sou mulher, devo estar a salvo.

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