Ilustração Marco Joel Santos |
Chegamos, pois, ao pós-feriado. Ainda ontem estávamos
todos felizes a ver os documentários da TV sobre o Salgueiro Maia e aquela
malta toda que fez a revolução do 25 de Abril de 74 e ontem já foi dia de
trabalho e hoje é 6ªfeira. Não, não quero um emprego bom, bom, bom, porque o
que tenho já me dá trabalho que chegue. Mas acredito que desse jeito a muita
gente.
Ora não me farto de ver os documentários sobre o 25 de
Abril. Politiquices à parte, gosto mesmo. Para já, as imagens são a preto e
branco e dão um encanto especial à coisa. Em qualquer país ocidental de então já
se filmava a technicolor, mas em Portugal era a preto e branco e já era bem
bom. Até fazia sentido, pois tínhamos na altura a mania de sermos um império em
que a maioria da população até era preta. Embora fossem os brancos que
mandavam. Outras coisas, outras loiças.
Por outro lado, gosto de rever imagens daqueles dias
porque tudo o que mexia era entrevistado na rua – já na altura – mas isso nem
era o mais importante. O importante é que o repórter de serviço estava sempre a
fumar enquanto entrevistava e isso sim é que era liberdade. Até na proclamação
da Junta de Salvação Nacional, se viam baforadas a sair por detrás das câmaras.
Era um fartote de tanto fumar. Liberdade total.
Ora então passados 38 anos da data retratada, menos um do
que tenho de vida, dou comigo a não assistir às cerimónias de comemoração do 25
de Abril. Evidentemente, já sei que o cavaco fez um discurso, o que, atendendo à
sua condição mental, é obra de monta. Já para não falar em mexer os lábios de
cera, o que inclusivamente deve ser doloroso. Já sei que o cavaco o ano passado
se lembrou de que havia uma crise muito grave em Portugal, mas parece que agora
imagina que tudo vai bem e na paz dos anjos. Evidentemente, não convidaram os
desempregados deste país para as galerias do parlamento. Não porque tivessem
medo da reacção dos desempregados, mas porque desempregado, por lá, já há muito.
Isto na acepção de pessoa sem emprego, ou seja, pessoa que não tem função
atribuída, ou ainda, que não faz a ponta de um caracol. Mas se os desempregados
lá estivessem, tenho a certeza que a cera que reveste a estátua de cavaco
derretia, porque os ânimos iam aquecer.
Por outro lado, a Associação 25 de Abril recusou ir às
cerimónias oficiais porque não revêem o 25 de Abril nas políticas seguidas
actualmente pelo nosso governo. Ora, não seria coisa mais fácil, porque, pela
primeira vez, um governo de direita obrigou os seus membros a usar cravos na
lapela. Cavaco, esse, que parece ser alérgico a cravos, levava um bem assente
pin de um cravo na lapela. Caiu o Carmo e a Trindade! Ora os senhores da
Associação 25 de Abril são a brigada do reumático! Ora que esses senhores, os
capitães de Abril, querem apropriar-se da revolução! Ora mais umas coisas
desagradáveis que por ali se disseram, inclusivamente uma coisa estranha que
disse a juventude laranjinha, que foi mais ou menos que cada vez mais se cumpre
o espírito de Abril quanto mais nos afastarmos dos seus desígnios. Ora esta última
afirmação é de uma juventude partidária, ainda por cima laranjinha, por isso
nem vale a pena comentar muito. Querem dizer que o branco é cada vez mais branco
quanto mais escuro for. Coisa do género. Ouvi dizer que fugiram 30 doentes do
Magalhães Lemos mas já apanharam 32. Só que nenhum era dos que fugiu. Esses refugiaram-se
numa juventude partidária…
Quanto à brigada do reumático, é verdade, os senhores
capitães de Abril, agora majores e coronéis – também era bom se passados 38
anos nunca tivessem sido promovidos – já não são assim tão novos e devem ter
algum reumatismo. Quanto ao apropriarem-se da revolução, isso é que já não
entendo. A revolução é deles! Foram eles que a fizeram, não o povo. Dizer que a
revolução é do povo é giro, mas o que teve o povo a ver com a revolução? Foram os
capitães de Abril que a fizeram, não precisam de se apropriar de nada, a
revolução é deles e sempre foi e sempre, em boa verdade, será. O povo só levou
com os resultados, pois também é certo que só assistiu pelo relato.
A liberdade dá para todos os lados. A Associação 25 de
Abril resolveu, em liberdade, não assistir aos festejos e dizer porquê. Porque não
se revêem no actual rumo da política nacional. É um direito que lhes assiste. Deputados
e outra gente de direita apelidaram-nos de brigada do reumático e até o passos
coelho se referiu a eles como querendo protagonismo. Assim tivesse ele um décimo
do protagonismo e tomates deles naquela madrugada de 25 de Abril. Mas é também
um direito que lhe assiste. Foi por isso que os capitães de Abril lutaram, pelo
direito de se poder falar destas coisas em Portugal.
A mesma liberdade que a mim me assiste de, a quem assim
tentou enxovalhar o testemunho vivo da luta pela Liberdade em Portugal, chamá-los
de nazis e mandá-los para a real senhora que os fez, num dia triste, nascer
para este mundo. Ainda hoje comeriam merda se não fosse a brigada do reumático,
seus badamecos da treta!
Contrariamente ao normalmente observado, opto por ser o primeiro a comentar. Inicialmente estava ali escrito que a revolução tem mais um ano que eu. Mentira. Eu é que tenho mais um ano que a revolução. Mas merda, também me posso tentar sentir melhor uma vez na vida, não?
ResponderEliminarPoder podes. Como nascido em 77 , (por sinal nesse ano só os vinhos vintage foram dos melhores) e Ramalho Eanes aquecia a cadeira da presidência, só sei desse 25/4, coisas que um ou outro livro apartidario me vai elucidando, umas imagens nostálgicas a preto e branco e pelas gentes tomadas também pelo reumatico que assistiram pela tv e radio. Estamos na mesma pá, somos pós revolução!
ResponderEliminarSó o facto de pela primeira vez terem colocado o cravo na lapela é bem revelador da mesquinhez de quem nos Desgoverna...
ResponderEliminarMarco, eu não me sinto pós-revolução. Pensei até que nunca me hei-de sentir assim.
ResponderEliminarSalvador, algo revelador... e perturbador, igualmente.
ResponderEliminarO problema é que a expressão "Brigada do Reumático" nos remete para outros bem diversos destes Capitães (note-se que escrevo com maiúscula)e para a encenação da manifestação de subordinação e solidariedade das chefias militares para com o regime, cerimónia que teve lugar a 14 de Março de 1974.Costa Gomes e António de Spínola que se recusam a comparecer, foram exonerados das suas funções.
ResponderEliminarAlguns deviam lavar a boca antes de se referirem a quem fez Abril!
Malena, ora aí está... Mas essas bocas imundas de alguns que não sabem quem os pais são é que vão prevalecendo...
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