Foto Google, Euro Skills 2010 |
Há muitos anos que ouço falar da legendária capacidade de trabalho dos portugueses por esse mundo fora. Levas de emigração são eleitas pelos países que as acolheram como das mais capazes, trabalhadoras e produtivas de entre as várias comunidades emigradas nesses países. E não faltam exemplos, desde a nossa vizinha Espanha, passando por França, Luxemburgo, EUA, África do Sul, Venezuela, etc. Não é raro que essas comunidades sejam enaltecidas por todos, a começar pelos governos dos países que as albergam. Os emigrantes contribuíram activamente para a economia portuguesa durante anos a fio, enviando remessas importantes de divisas, tantas vezes olhadas de soslaio por quem cá estava, muitas vezes dependendo delas para a sobrevivência.
Isto leva-nos a pensar no que diferencia as nossas comunidades no estrangeiro, entre as mais produtivas do Mundo, e os portugueses que vivem no seu próprio país, com uma das produtividades mais baixas do Mundo. E a explicação é simples. A meu ver, há dois factores que contribuem decisivamente para tamanha disparidade:
- a motivação - o emigrante parte em busca de uma vida melhor, para si e para os seus. Não se importa de trabalhar arduamente para receber os rendimentos que julga adequados às suas expectativas. Ou seja, a trabalho árduo, corresponde rendimento elevado. Não interessa se é a lavar escadas ou a assentar tijolo - se o português, no final do mês, olha para o seu bolso e se vê recompensado financeiramente, não se importa de repetir o esforço vezes sem conta. Isto porque tem uma família para cuidar, e um futuro para zelar e assegurar, para os seus filhos. Por outro lado, a própria fama dos portugueses no estrangeiro actua como motivação. O português defende ferozmente as suas capacidades no estrangeiro. Então e em Portugal? Não é necessário dizer muito, não é verdade? Trabalhar arduamente num país que tem um ordenado de 425 euros mensais para dar não compensa muito. Não há grandes razões para se andar motivado. Por outro lado, os constantes chavões gritados na comunicação social por muitas vozes "importantes", chamando malandros aos portugueses constantemente, não são motivadoras. Além de tudo, o Subsídio de Desemprego, que por vezes é igual ou até mais elevado que o ordenado que se oferece aos desempregados, ao qual se subtraem as despesas cada vez mais onerosas de se trabalhar cada vez mais longe de casa, é desmotivador.
- composição da emigração - genericamente, quem emigra (salvo raras excepções), é uma classe à procura de trabalho que não consegue encontrar em Portugal. Há 30 anos atrás, eram os trabalhadores indiferenciados. Hoje, além desses, há os jovens licenciados. Não vemos, pois, dirigentes ou quadros superiores a emigrar, salvo a coberto de multinacionais. De que forma isto diferencia os portugueses emigrantes dos que cá ficam? Simples, têm chefias estrangeiras. Não estão sujeitas ao pior dos efeitos desmotivadores em Portugal: as chefias. Ou porque são incapazes ou porque são... incompetentes - há uma diferença aqui, subtil mas importante. Os emigrantes livram-se do pior que temos em Portugal: a sua classe alta, a classe dirigente, os incompetentes do país (com honrosas, e, vá lá, cada vez mais numerosas excepções), ou por terem chefias realmente mais capazes e competentes, ou, como é usual na emigração extra-Europa, por se estabelecerem corajosamente por conta própria, livre de mais um dos pecados nacionais: a cada vez maior desincentivação do empreendedorismo e a sujeição, cada vez maior, ao cartão de militante partidário ou às cunhas do tio do avô do cunhado que é amigo do ti não sei das quantas ou do Comendador tal...
A foto em cima representa a equipa de jovens portugueses que arrebatou, sem dificuldades, o primeiro lugar no campeonato europeu de profissões, o Euro Skills. São jovens, motivados, com conhecimentos, talentosos. E são trabalhadores, não são chefes. São os mais qualificados da Europa, pelos vistos. Representam o nosso futuro. Representam também aqueles que conseguiram de alguma forma escapar às garras de um sistema de ensino castrador e imbecilizante que urge erradicar. São técnicos com elevada formação. Muitos deles com formação no Ensino Superior. E no entanto, cortam cabelos, assentam tijolo, montam máquinas, reparam motos e automóveis... E são os melhores da Europa a fazê-lo! Vamos vê-los a trabalhar em Portugal? Seguramente que não. Não aceitarão os 425 euros mensais e abalarão a oferecer os seus imensos conhecimentos e capacidades por esse mundo fora. E esse mundo aproveitá-los-à da melhor forma. Por cá ficarão os nossos "chefes", aqueles que deram os tais 425 euros mensais aos melhores trabalhadores da Europa. E a vergonha com eles.
A minha maior felicidade é trabalhar numa multinacional. Tem chefias portuguesas, é certo. Mas bem imbuídas daquilo que distingue uma multinacional da maior parte das empresas portuguesas: o saber liderar.
Amigo, tocaste num ponto importantíssimo: a fuga dos nossos "melhores". Estamos a desperdiçar talento! É incrível o que se está a passar e a tendência é piorar... e muito. Na última leva de colegas formados, muitos desejavam emigrar, o que é gravíssimo. Não existe muito que nos prenda por aqui. Amor ao país não está a ser suficiente e os campeonatos europeus e mundiais de futebol só acontecem de 2 em 2 anos...
ResponderEliminarPS: no Brasil, apesar das anedotas, a comunidade portuguesa é das mais respeitadas e reconhecidas. A para dos japoneses, nós somos os que mais "trabalhamos".
Cirrus, acho que te esqueceste de outra coisa muito importante no que diz respeito à falta de produtividade global dos portugueses em Portugal quando comparada com a excelência no exterior, que é a estrutura que existe aqui. Houve investimentos que ficaram por fazer, houve subsídios para modernização que foram desperdiçados e metidos ao bolso, e existe uma desorganização de bradar aos céus em muitas empresas, o que não contribui para que haja produtividade.
ResponderEliminarDepois, claro, a não valorização do factor trabalho que existe aqui é gritante. Crescem como cogumelos as ofertas de estágios não remunerados, salários mínimos (que se fixavam nos 475€ e não nos 425€ que referiste, e que este ano subiram para 485€), a manutenção de pessoas anos a fio a recibos verdes, enfim, o trabalho não é valorizado, logo o trabalhador fica desmotivado, é claro.
Sara, esse primeiro aspecto que justamente focaste, quis eu incluí-lo na parte das "chefias". É bem verdade o que dizes, eu não especifiquei porque adivinhava já o post longo.
ResponderEliminarOs 425 euros é o ordenado que está em vigor. Há muita gente aí que pensa que são 485. Mas 11% vão para a Segurança Social. Vá lá, 430...
Cat, com aquilo que oferecemos aos nossos melhores cérebros e mãos, que esperamos? Esperamos fixar neste país muita competência com os ordenados que temos? Queremos aumentar a produtividade a troco de uma tigela de sopa? Porque não instituímos a escravatura? Seria mais fácil, talvez. É óbvio que os teus colegas e os meus e toda a gente, neste momento, está a pensar em emigrar. nem todos o fazem, mas todos o pensam.
ResponderEliminarO engraçado é que os "malandros" que não querem trabalhar aqui em Portugal por 425 euros mensais vão lá para fora e são os melhores trabalhadores do mundo. Ganham é mais. Quem perde é Portugal.
Infelizmente, os lideres portugueses fazem mais é roubar, que por acaso rima com liderar! Equivocaram-se no verbo!
ResponderEliminarCusta ver os nossos juvens a fugir para outros países, muitos deles depois de usufruirema de bolsas generosas de vários anos do nosso governo. Para quê investir na sua formação se depois não lhes criam condições para ficar? Enfim!
Malena, a questão está no que este país e seus "líderes" e "chefes" e demais gente "importante" está disposto a dar a estes talentos. Fica mais barato deixá-los ir embora e depois queixarmo-nos de baixa produtividade, que ainda hoje não sei o que é, de tal forma é uma patranha bem elaborada!
ResponderEliminarNão esquecer que muitas das chefias só o são, não pela competência, mas sim pela incompetência que permite que alguém as use para dirigir o barco como bem lhe aprouver.
ResponderEliminarOutro problema que não focaste, mas considero importante é a falta de estratégia e planeamento a médio e longo prazo... tudo se penso no imediato, no lucro fácil e onde o bitaite dita as leis.
Pronúncia, digo-te o mesmo que disse à Sara. Isso está implícito quando falo de chefias. No entanto, o post já ia ser longo e não pude especificar tudo... Mas o compadrio e as cunhas estão lá. O planeamento... Bem, onde isso nos levaria... Não existe em Portugal.
ResponderEliminarComo já tinha escrito no meu blogue, muito do patronato tem baixa escolaridade e uma ainda pior aptidão profissional.
ResponderEliminarQuando o exemplo deveria ser dado pelo topo da hierarquia, acontece precisamente o contrário. Nem é preciso muito: por vezes, basta uma palavra de incentivo ao trabalhador. Como disse a Pronúncia, querem o lucro fácil em detrimento do investimento profissional.
Quem emigra
merecerá sempre o meu respeito e admiração.
Com esta intervenção social, esta alienação, desde há 35 anos que os governos têm vindo a desempenhar o papel para o qual foi incumbido o soares: Fabricar mão de obra barata e descartável para os países centrais da UE.
ResponderEliminarHaverá mais factores certamente, pois o estatuto de emigrante comporta certas caracteísticas a montante e a jusante da emigração propriamente dita, ou seja, se, por um lado, quem decide emigrar já de distingue de quem fica ao nível da procura activa de melhorias em vez da passividade, por outro lado, no país que os recebe, também há influências exteriores que os "obrigam" a ser melhores para justificarem o trabalho, aliás, isso também é visível cá porque se for necessário despedir alguém não se vai despedir o nacional em detrimento do estrangeiro... a não ser que o estrangeiro trabalhe muito melhor. Mas como disse, essas razões que apontaste são, sem dúvida, importantes.
ResponderEliminar(Não utilizes legendário, porque isso só se pode referir em português às legendas. Os ingleses utilizam legendary, mas é o que se chama de um false friend, cuja tradução será sempre lendário, essa sim a forma correcta)
Dylan, eu tentei nem chegar a esse ponto de chamar pelo patronato. Fiquei-me pelas chefias. O que só quer dizer que estás certo e foste mais directo ao assunto.
ResponderEliminarTem o meu respeito. Hoje ainda mais.
CRN, essa é uma tarefa que penso todos os nossos governantes, desde sempre, tentaram implementar. E conseguem-no. Não sou soarista e ando longe disso, mas nesse aspecto tivemos bem pior que Soares. E também Presidente.
ResponderEliminarSalvador, essa diferença é inerente ao facto de neste país não se darem condições condignas a quem quer trabalhar. Quer trabalhar, mas também quer viver. E não ser escravo.
ResponderEliminarPenso que essencialmente o emigrante ocupa, muitas vezes, nichos de mercado específicos, com escassa concorrência autóctone. Mas sabemos que o português, além de desenrasca, é um excelente desenrasca. E muitas vezes faz um bom trabalho por si só. Mas se for bem orientado... É um trabalhador espantoso. E normalmente de confiança.
Salvador, a propósito do legendário, a Porto Editora e eu coincidimos na opinião:
ResponderEliminar"legendário
adjectivo
1. relativo a legenda
2. ⇒ lendário
nome masculino
autor de legendas
(Do fr. légendaire, «id.»)"
Cirrus,
ResponderEliminarSerá fácil estar de acordo contigo, basta analisar o actual elenco governativo, mas, também tivemos melhor, muito melhor. Uma excepção.
Cumprimentos.
Cirrus, não existe e dificilmente existirá... não se dá bem com ciclos eleitorais e lucros imediatos. O que interessa é o aqui e agora... o futuro? quem lá chegar que se preocupe...
ResponderEliminarSalvador?! Não quererias dizer Johnny?!...
CRN, sinceramente, não me consigo lembrar dessa excepção...
ResponderEliminarPronúncia, tens alguma razão... Em ambos os aspectos. Mas só alguma!
ResponderEliminarJohnny, confundi-o com o Salvador! As minhas desculpas!
ResponderEliminarSalvador, se cá passar, as minhas desculpas!
Feliz Ano ! com tudo aquilo que mais desejares
ResponderEliminarbeijo
até sempre...por aqui...
teresa
Só alguma?!... Puffff!...
ResponderEliminarEu fiz um pedido: "Não utilizes legendário".
ResponderEliminarNão acedeste ao meu pedido, mas prontoS...
Quanto à Porto Editora, só lhes fica mal a eles PORQUE EU É QUE TENHO RAZÃO.
Tem tudo a ver com a adaptação de estrangeirismos e, se calhar, de acordos ortográficos mas basta pensar na palavra primitiva para ver que (no mínimo) não fica tão bem. Legendário vem de legenda que tem pouco a ver com o significado que querias dar à frase.
Legend, em inglês, sim, refere-se à lenda, até porque eles não têm essa palavra (lenda) mas em português legenda quer dizer só uma coisa.
Mas não vou teimar, aliás, nem era disso que falava o post ou o comentário. Só vim ver se concordavas com a minha perspectiva multifactorial... ?
Teresa, bom ano.
ResponderEliminarPronúncia, contigo é preciso ter algum cuidado... Não te podemos dar a razão toda, porque és pequena e não podes com ela.
ResponderEliminarJohnny, pelo contrário. Legenda só tem o significado que lhe dás há relativamente pouco tempo. O termo Leyenda, no galaico-português, é equivalente a "lenda" e deu origem à palavra portuguesa e galega Legenda, que tanto tem o significado mais erudito e antigo de lenda, como o mais corrente de legenda.
ResponderEliminarE a perspectiva multifactorial?
ResponderEliminarQuanto à questão adjacente, de muito menos importância, trago à colação a página das Ciberdúvidas
ResponderEliminar(http://www.ciberduvidas.com/pergunta.php?id=341) na qual se lê:
[Pergunta] Normalmente uso "lenda" com o significado de "famoso", num contexto "histórico/fantástico" e "legenda" enquanto "letreiro, apontamento a imagem". (Exemplos - "Lendas e Narrativas" e "a legenda da fotografia").
Ultimamente, tenho ouvido e lido "legenda" com o signifcado que julgava reservado a "lenda".
Será correcta tal utilização?
Pedro Brás Marques :: ::
[Resposta] A origem das duas palavras é a mesma: vêm de legenda que em latim significava «as coisas que são para ler, que devem ser lidas».
A evolução semântica e fonética de legenda deu, em português, lenda, primitivamente com o significado de narrativa de episódios da vida de um santo que era lida nos refeitórios dos conventos, para que os frades, enquanto alimentavam o corpo, alimentassem também a alma com os edificantes exemplos.
O sentido evoluiu depois para conto, narrativa ficcional quase sempre mítica.
Com o advento das legendas explicativas que acompanhavam ilustrações, houve necessidade de recorrer à palavra que conservou a forma erudita: legenda, com um sentido muito próximo do que tinha em latim.
Não me parece, portanto, muito correcto usar uma pela outra.
(Fim de citação)
Ora aí está, meu caro, o sentido mais antigo na nossa língua (galaico-português) , como pode ver, é o de lenda...
ResponderEliminarA perspectiva multifactorial tem uma grande multiplicidade de interpretações. Demasiado extenso para uma dimensão tão monofactorial como uma janela de comentários...
ResponderEliminarCirrus,
ResponderEliminarChamava-se Vasco Gonçalves.
Cumprimentos.
CRN, o período em que Vasco Gonçalves tentou governar era demasiado conturbado fosse para o que fosse. Não duvido da sinceridade ou dos motivos do amigo Vasco, mas ficou no ar a ideia de que não era possível, na altura, fazer grande coisa. Eu era pequeno nessa altura, e as minhas recordações mais vívidas da política são já posteriores ao gonçalvismo. Por isso posso, apesar de tudo, dizer que não me lembro da tal excepção.
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