quarta-feira, 25 de julho de 2012

A GRANDE DESCULPA


Ilustração Marco Joel Santos
Estamos numa altura interessante da existência humana sobre o planeta Terra. E com certeza qualquer outra geração humana durante a breve história da espécie diria o mesmo da sua época. Foi, portanto, uma forma absolutamente inócua de começar um texto. Um exemplo de como, por vezes, dizemos muitas coisas que não querem, em rigor, dizer absolutamente nada.
Assim penso eu do estado de espírito que por aí vejo, por esse país, por esse mundo fora. Tornou-se tão corrente ver gente deprimida por todos os cantos que sinceramente esse passou a ser o estado normal humano. Sou, pois, um anormal. Como alguém me diz de vez em quando, o melhor ainda está para vir.
A depressão não é a grande doença da humanidade do século XXI. Eu penso que essa ainda será o cancro, ou a sida, ou outra qualquer dessas coisas a que chamamos “malzinhos ruins”. Como se um houvesse “malzinhos bons”... Bem, a meu ver, a depressão nunca poderia ser a grande doença do século XXI. Porque, para mim, a depressão não existe. É apenas mais uma invenção de quem nada tem mais que fazer do que inventar doenças. E doenças do foro psicológico ou psiquiátrico, essas então, são muito fáceis de inventar.
O ser humano alterou-se com o tempo. Passou por muitas fases. Melhores, piores... Agora está na fase da negação absoluta. As pessoas negam. As pessoas fogem. As pessoas não querem sofrer. Sem perceberem que são bebés grandes. Sem perceberem que o sofrimento faz parte da vida, é necessário acarinhá-lo, é necessário aceitá-lo, é necessário nutri-lo. O que fazem os pais aos filhos? Não é libertá-los para o mundo, depois de os nutrirem? Pois o sofrimento é nosso filho. E, para o libertar para o mundo, temos de o aceitar, nutri-lo, alimentá-lo, enfim, aguentá-lo. Só assim, fazendo parte intrínseca da nossa vida, o podemos compreender, aceitar e diminuir o seu impacto nessa vida. Enfim, libertar-nos dele. Fugir de nada adianta.
Mas é em fugir que a espécie humana se tornou perita. São os livros de auto-ajuda, são as citações de autores de vacuidades que supostamente inspiram vidas, são os Xanax e os Prozac, são as depressões. Há gente que consulta o mesmo psiquiatra há 20 anos! Se eu consultasse um médico há 20 anos e não ficasse curado, começava a desconfiar – ou do médico ou da doença. Ninguém quer falhar, ninguém quer sofrer, todos fogem.
Talvez seja da pressão desta libertina forma liberal de vida que agora nos impõem. Sei que o falhanço não é admitido. Ser normal não basta. Tem de se vencer, a todo o custo. Mas não a custo do sofrimento. Para esse há umas pastilhas, uns comprimidos, umas consultas. Ninguém aceita a sua própria condição de ser humano igual aos outros. É necessário vencer! É necessário ser o melhor, é necessário ser excelente! Acontece que 99,999% dos seres humanos não são excelentes. São normais. E sofrem. Ou deviam. Não sofrem porque se afogam em drogas, se refugiam em consultórios esconsos ou alegam a mais esfarrapada das desculpas para o facto de serem normais e de nem sempre serem os melhores exemplos de trabalho, de competição ou de, sequer, seres humanos – a depressão.
Porque será que ninguém aceita ser humano? Porque será que já ninguém está pronto a sujeitar-se às leis da vida? Porque será que todos anseiam por aquilo que nunca poderão ter? Não porque não tenham aquilo por que ansiavam ontem, mas antes porque hoje já anseiam mais. E mais! E mais! E depois falham. Inevitavelmente, falham. Não aceitam a mágoa, não a podem aceitar – porque, afinal, são excelentes! Não podem falhar. Até quando um ente querido morre, se refugiam nos Xanax e Prozac, consultam médicos inúteis ou apenas alegam depressão... Aceitem! A nossa vida é aquilo que vai acontecer até morrermos. Nada mais. Não somos melhores, não somos piores. Somos o que somos. Falhamos, caímos, erramos. Aprender com o erro não é levantar-se de imediato, é chorar porque doeu, compreender que vai doer de cada vez que acontecer e... viver com isso!

sexta-feira, 20 de julho de 2012

URGE FECHAR


Ilustração Marco Joel Santos

Segundo um conjunto de peritos, o governo seria esperto e avisado se fechasse, por esse país fora, uma série de serviços de Urgência. A notícia não é nova e nem sequer espanta muito quem esteve minimamente atento ao que se tem passado, nos últimos anos – e não apenas no último ano – no sector da saúde.
Ora a saúde é um dos quatro pilares, e falo pela minha cabeça, não pela dos peritos (quaisquer que sejam, não necessitam ser estes que elaboraram este estudo), da vida social. Ou seja, é um dos quatro sectores que queremos ver suportados, num estado democrático como o nosso (e salvaguardem-se díspares opiniões), pelo dinheiro dos malfadados impostos que todos pagamos. Os outros três são a educação, as vias de comunicação e a justiça. Muito se poderia efectivamente falar de qualquer destes sectores, mas apenas a saúde me leva a escrever hoje mesmo este texto.
Tudo isto para dizer o quê? Ora, se pagamos impostos, queremos cuidados de saúde? É mais ou menos isso. Mas esta notícia não me deixa ficar por esta análise tão crua e simplista. Portanto, é provavelmente altura da parvalheira.
Primeiro, o grupo de peritos. Quem são estes gajos? Alguém sabe? O que os habilita a retirar conclusões que tão nefastas consequências podem ter na vida de pessoas normais, como eu e o leitor? Será que são utentes do SNS? Longe de mim pôr em causa a propriedade intelectual deste conjunto de peritos que elaborou este estudo. Mas se as suas conclusões a mim me afectam de forma directa, nada melhor que conhecer o seu trabalho, os seus métodos e, se possível, as suas motivações. Porque além de tudo me parece que hoje em dia brotam peritos em tudo e mais alguma coisa do chão como cogumelos.
Dizem estes peritos que, com o fecho destes serviços de Urgência, qualquer utente não fica a mais de uma hora de um serviço de Urgência. Posso concordar com isto, partindo do princípio que todos os utentes possuem viatura própria. Acontece que nem sempre isso se verifica, por um lado, e verifica-se, por outro lado, que uma parte considerável dos necessitados destes serviços não está propriamente em condições óptimas de condução. Estão a ver, por exemplo, um acidente doméstico? Um braço partido, ou uma mão entalada numa porta. Pois, pelo critério dos peritos, o acidentado, numa hora, põe-se a caminho das Urgências mais próximas. Poderão contrapor que um caso destes seria transportado por uma ambulância. É bem verdade. Imaginem que o acidente se deu em Freixo de Espada à Cinta e tentem fazer chegar uma ambulância a Bragança numa hora. Obviamente, toda a gente consegue tal façanha, a começar pelos peritos que a esta conclusão chegaram.
Além do mais, ter acesso, numa hora, a um serviço de urgências, mesmo que se verifique, parece ser condição suficiente para satisfazer os peritos. Não sei se estes peritos já estiveram alguma vez em situações de urgência. É que uma hora é mais que suficiente para que a situação de urgência deixe de ser urgente, não pela cura das maleitas, mas antes pela contratação do cangalheiro mais próximo. E esse não tem apenas uma hora, tem bastante mais tempo para lá chegar…
É certo e sabido que qualquer gripe ou espirro de um infante é o suficiente para fazer os progenitores porem-se a caminho das urgências. Proponho que nestes casos os prevaricadores sejam multados em 10.000€. Os seus rebentos não são flores de estufa nem são especiais, nem são o melhor do mundo. São como os outros e provavelmente, se crescerem com tais progenitores, passarão a ser montes de matéria fecal como eles. Por isso, nem são grande matéria fecal. As Urgências são para casos Urgentes. Há poucos casos urgentes em determinadas áreas do país? Talvez, mas quando ocorrerem, oxalá não ocorram a um qualquer perito armado em “turista ecológico” como agora está na moda, caso contrário as conclusões do estudo poderão mudar num ápice.
Por outro lado, é interessante verificar que, em tempos de corte de despesas, a torto e a direito, como estes em que tristemente vamos existindo, haja dinheiro no Ministério da Saúde para pagar a privados estes estudos. Acho interessante. Podemos até fazer as contas e calcular quantos serviços de urgência poderiam ser mantidos em funcionamento com o montante pago aos peritos. E será, pergunto eu, que sou leigo nestas coisas, que no Ministério da Saúde não trabalha ninguém que seja perito em Urgências? Estranho.

terça-feira, 10 de julho de 2012

A CIÊNCIA É LINDA!

Ilustração Marco Joel Santos



Alguém percebeu esta coisa da descoberta do bujão do Higgs? Parece que o Higgs já tinha descoberto o bujão dele há cinquenta anos mas agora confirmaram que o bujão do Higgs pode realmente existir, o que não é uma certeza, mas apenas uma forte probabilidade.
Há alguns aspectos desta história que merecem ser relevados. Primeiro, o facto de o Higgs ter descoberto uma coisa há cinquenta anos, mas que afinal hoje em dia se desconfia que existe. Por este andar, amanhã será considerado ficção. Ou é da minha visão, ou os físicos nucleares estão agora no caminho dos economistas. Falam como o catano, mas acertam pouco. Mas, pelo menos não se arriscam muito – é tudo possível.
Segundo aspecto a ter em atenção: o Higgs descobriu que tinha um bujão. Ora não é descoberta de somenos. Não sei exactamente que idade tinha o Higgs quando fez tal descoberta, mas penso que quase todos nós temos essa noção a partir do momento em que largamos a fralda.
Terceiro aspecto estranho da estória: dizem agora que no CERN se descobriu a possibilidade muito forte de se confirmar a existência do bujão que o Higgs tinha descoberto há cinquenta anos. Duas questões: construiu-se o mais caro objecto da Terra para descobrir a possibilidade de alguém ter um bujão. E, por arrastamento, o Higgs terá de rever milhares de idas à casa de banho, porque é provável que tenha um bujão, mas existe a possibilidade de não ter, o que, a confirmar-se, daria a volta ao miolo (e ao intestino) ao pobre do Higgs, só de imaginar o nobre acto de defecar sem recurso ao bujão.
Quarto aspecto é a existência de Deus. Alguns cientistas, um pouco mais economistas que os outros, dizem que o facto de o Higgs ter um bujão confirma cabalmente a existência de Deus, e que o mesmo bujão até pode ser chamado de partícula de Deus. Ora, toda a gente sabe que eu não sou religioso, mas sinceramente ligar a existência de um bujão no Higgs a Deus é abusivo. Se fosse uma costela, ainda vá que não vá, porque parece que Deus, nos princípios, gostava de treinar o corte de carnes verdes e tal… Mas agora, um bujão? Eh pá, sem ironias, um pouco mais de respeito por quem acredita. Estes cientistas são um bocado malucos.
Quinto aspecto, e mais há com certeza, mas por aqui me fico: este bujão de Higgs tem massa! Duas considerações me merece esta afirmação: primeiro, se se referem ao que passa pelo bujão, nunca como massa tinha visto referido. Quer dizer, já muitos nomes lhe chamaram, como isso e aquilo e até coelho, mas massa… Bom e depois há os que fazem o sentido inverso, e não sei se o Higgs é desses, mas também nunca ouvi chamar massa àquilo e coiso. Segundo, em rigor o bujão não tem massa nem tem nada. Porque o bujão, na realidade, e até mesmo do Higgs – a existir, claro – é, essencialmente, um… buraco.
Queres ver que construíram um buraco negro no CERN e chamaram-lhe bujão? Faz sentido… mas nesse caso, podiam ter ido à AR… Ficava mais barato. E bujões não faltam por lá, diga-se…

quarta-feira, 4 de julho de 2012

OS DNO'S

Ilustração Marco Joel Santos


Neste mundo há requisitos. É uma realidade a que muita gente tenta escapar, mas não consegue. Neste mundo há requisitos. O mais conhecido de todos é que para se morrer tem de se estar vivo. Quer dizer, pelo menos convém. Um morto morrer é mau sinal, se bem que a TVI já matou mortos nas notícias por várias vezes. Isso e descobrir pinhais de eucaliptos é das grandes proezas da TVI. Mas voltemos à vaca fria, que é uma expressão que nunca entendi muito bem, e não sei se temos de refrigerar a vaca antes ou basta soprar um bocadinho. Outro requisito muito conhecido é aquele que diz que só se vai para o céu se formos muito bonzinhos cá na terra. Ou muito católicos, o que não é necessariamente o mesmo. Porque em outros países quem é muito católico arde no inferno. Mas, aí está, são requisitos. Mudam de sítio para sítio, mas há sempre requisitos. E o dos mortos nem muda de sítio para sítio, só mudam os mortos.
Já percebemos, pois, que também aqui em Portugal há requisitos. Por exemplo, para descobrir um pinhal de eucaliptos tem de se trabalhar na TVI. Para se ser popular, tem de sair o euromilhões. Para ir para a praia, tem de se levar toalha. Para se ser enfermeiro tem de se tirar um curso superior. Para se ser político também. É feio ser político sem curso. Quer dizer, se for um político do centro ou da direita. Se for da esquerda, até é porreiro, tipo metalúrgico do PC, não se ter curso superior. Mas, de forma geral, é preciso ser doutor, até porque depois dá jeito nas entrevistas manter a distância para o povinho que está a ver na TV. Um doutor ou um engenheiro dá sempre jeito.
O problema é que a nossa juventude partidária, e quando falo da nossa falo da da minha geração, mais arroba menos quintal (esta sim, uma expressão que entendo), que é a que está agora no poder, não teve tempo para tirar os cursos superiores, pois desde cedo se afadigaram nas jotas a colar cartazes e trabalhar faz calos, não há tempo para calhamaços nem frequências. Já tivemos um político tão ocupado, mas tão ocupado, que teve de terminar a licenciatura num domingo! Ainda falam os merkels de produtividade! Depois temos outro que só tirou a licenciatura quando se apercebeu que mais ninguém queria ser presidente do partido. Nada que não o impedisse de ocupar, já antes da licenciatura, altos cargos de administração de empresas de serviço público. E não era doutor! Mais uma para os merkels!
Agora temos o caso de um outro grande político da nossa praça (outra expressão que faz pouco sentido, parece que o país é uma imensa praça e não uma imensa praia, como dizem os merkels) que, tendo até frequentado o curso de Direito, já num longínquo ano de 1985 (ainda havia Leis, imaginem lá o tempo que já lá vai), fez uma honrosa disciplina com 10. Depois de oral. Nada de dramático, até porque no oral o político português é perito – é a falar que nos f… azem pensar na vida. Depois frequentou o curso de História, no qual não fez qualquer disciplina, e depois Relações Internacionais, onde também não obteve qualquer aprovação. No entanto, longe de ser um caso perdido, o nosso político faz-se o homem mais poderoso do seu partido (colou mais cartazes que os outros jotas) e tinha de ter um curso, até porque estava farto de ir ao Brasil e ser tratado por “seu” e “chapa”. Assim, arranjou uma universidade de qualidade universal e faz o curso de Ciência Política num ano! Uma licenciatura de três anos em apenas um! Está explicado porque é tão poderoso! Porque realmente é uma inteligência. E porque parece que aproveitou uma espécie de lei que permite que as universidades tenham cursos de Novas Oportunidades! Sim, onde é valorizada a experiência profissional. Ora, o nosso político é um DNO – Doutor das Novas Oportunidades! Esta cooperação entre governos deixa-me sensibilizado. O facto de um membro do governo actual aproveitar uma iniciativa do governo anterior só mostra que há consenso em Portugal! Acalmem-se os merkels!
Vou acabar por aqui, porque parece que tenho uma data de lâmpadas para mudar e canos para arranjar. Seria uma enorme trabalheira, não fosse ter contratado um enfermeiro para me fazer o trabalho mais pesado. Tenho pena dos enfermeiros, coitados. Eu pago ao meu quatro euros por hora e ele arruma a casa e tal… Mas a verdade é que os enfermeiros são gente muito estúpida. Quem demora cinco ou seis anos para tirar um curso que depois paga quatro euros à hora só pode ser estúpido. Porque se fossem inteligentes, ou pelo menos espertos, tiravam um curso que até dá para ser ministro num ano!