segunda-feira, 30 de abril de 2012

PORQUE LEVOU PASSOS A PAULA?


Ilustração Marco Joel Santos

Há uns dias, escrevi um post que pretendia, de algum modo, explicar o epíteto dado ao nosso governo de neo-liberal. Não talvez explicar porque razão o governo é liberal ou não, mas antes explicar o que é o liberalismo e porque se pode considerar que o nosso governo se encaixa nessa corrente política ou não.
Expressei a minha opinião acerca desse assunto, e não tenho grande pejo em afirmar que sim, o nosso governo é liberal. Nos ideais, é claramente liberal. E só não é mais liberal porque, como é compreensível, o liberalismo é uma tão grande utopia como foi o Leninismo, ou seja, nunca foi implementado um sistema liberal na Europa ou em qualquer outra parte do Mundo que funcionasse como pretendido pelos seus fundadores ideológicos Locke e Smith. E provavelmente será impossível implementá-lo, por razões hoje tão óbvias que nos chocam todos os dias.
Muitos preocupam-se em negar o cariz ideológico das medidas deste governo, assumindo que o destino do país está num tal de memorando de uma tal troika, que tanto o PS, como o PSD, aceitaram implementar em Portugal. Ora, na verdade, quem leu o memorando? Quem sabe o que é o memorando? Quem avaliou esse documento e sob que ponto de vista?
Eu li o memorando, nas alturas em que saiu para conhecimento público. Parecia que estava a ler um tratado de governação de Locke, ou um escrito de Smith ou ainda uma qualquer palestra de Max Weber ou Landes. Só que com muitos números à mistura. O memorando é um tratado liberal. Perguntar-me-ão então porque foi assinado por dois partidos que não são liberais? Bem, pelo PSD é óbvio que seria sempre assinado, porque a corrente do PSD actualmente não é a social-democracia “levemente de esquerda”, como Francisco de Sá Carneiro a definiu na origem do partido, à imagem da social-democracia nórdica de Palme. A actual corrente ideológica do PSD é o liberalismo. Quanto ao PS, há muito que este partido meteu o socialismo na célebre gaveta. Com um ressurgimento medroso nos tempos de Guterres, o PS optou descaradamente pelo liberalismo de Sócrates. Será abusivo caracterizar o PS, actualmente, como partido de esquerda? Não sei. No tempo de Sócrates, o PS era um partido liberal, logo assumidamente de direita. Não por acaso surgiram dissidências importantes dentro da ala mais à esquerda do PS. Actualmente, quem souber o que é Seguro e o que pretende este obscuro líder de juventude partidária, me envie um e-mail, de forma a ficar elucidado. Não foram só o PS e o PSD que assinaram o memorando. O CDS também assinou. Mas esses já todos sabemos que são de extrema-direita. No mesmo sentido em que chamam extrema-esquerda ao BE e ao PCP, evidentemente.
Para quem não sabe o que é, ainda, o liberalismo, e o confunde com libertarismo ou mesmo com liberdade, Passos Coelho deu um exemplo muito claro esta semana. No debate quinzenal no Parlamento, o governo escolheu como tema as “medidas para o crescimento económico”. Quem levou Passos para o Parlamento? O cada vez menos ministro Álvaro? O super-ministro, o Gaspar? Não, levou a ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz.
Porque raio um primeiro-ministro, no seu perfeito juízo, levaria a ministra da Justiça para falar de medidas de apoio à economia para o parlamento? É uma pergunta perfeitamente legítima, do ponto de vista da nossa democracia peninsular e sulista-europeia. Mas relembro um dos primados mais importantes do liberalismo: a redução do Estado à legislação, que deve facilitar a economia. O liberalismo não acredita na intervenção do Estado na economia. Por duas razões: porque o Estado, no caso o governo, quase sinónimos para o liberalismo, não existe como corpo administrativo. Segundo, porque o único regulador dos mercados são os próprios mercados, ou seja, apenas vigoram as leis de mercado na economia. De que forma pode o Estado, ou o Governo, influir na economia? Através da justiça, único regulador que pode ficar nas mãos do estado, segundo o liberalismo, para além do poder legislativo puramente facilitador da actividade económica.
Eis porque Passos Coelho levou Paula Teixeira da Cruz ao parlamento para anunciar medidas “de crescimento económico”. Passo Coelho assumiu, perante o país e perante quem quis ver, que é um liberal de corpo inteiro. Depois há todo o reverso da medalha, que devia ser erradicado e não é, que é a mama que o estado constitui para o sector privado, que levou este país à ruína.
Noutros países, aproximações mais ou menos imperfeitas ao liberalismo, o problema deste sistema político é sempre o mesmo: perante o primado da economia e, ultimamente, da Finança, o estado tem de intervir constantemente para evitar que o excesso de iniciativa privada enjeite uma massa cada vez maior de pobres apanhados pela engrenagem. Assiste-se a isto, constantemente, nos EUA e na Grã-Bretanha, bastiões mais aproximados ao liberalismo. Em Portugal, o problema é outro. O problema para o liberalismo em Portugal prende-se com a acefalite que afecta a iniciativa privada. Como as ideias para por a economia a funcionar, pela parte do sector privado, são menos que um zero absoluto (0ºK, ou seja, -273,15ºC, o que convenhamos, é frio comó caraças), apenas regular pela legislação e justiça, apesar de Passos assim o desejar, é infrutífero. As reacções dos “empresários” portugueses assim o indicaram. Não acreditavam, nem podiam acreditar no que estavam a assistir! Pois, o liberalismo é giro, mas não depende exclusivamente do facto de o Estado vender empresas a um sector privado que as não sabe rentabilizar, inventando formas contratuais, posteriormente, para poder compensar os prejuízos que esses iluminados obtêm dessas empresas. Mais ainda, remunerar o seu mau desempenho à frente delas, garantindo rentabilidades! Pois é, o liberalismo não é isso, caros amigos “empresários”. Isso é só Tachismo.

domingo, 29 de abril de 2012

Venda a retalho

A Troika e a crise levaram os portugueses a ser condicionados a acreditar que privatizar é a solução para nos salvarmos da desgraça. O Estado abandona-nos e nós nem nos damos conta de que pagaremos muito caro esse facto, no dia em que virmos as grandes famílias do poder económico apoderar-se do país, num regresso ao passado bafiento da pré-revolução! António Borges tem nas mãos o poder que lhe foi delegado pelo Governo de Portugal para vender o país a retalho e, não tarda, nada restará. E nós a ver a procissão a passar! Detesto procissões!

sábado, 28 de abril de 2012

AS VONTADES



Aqui chegados, aos idos de Abril de 2012, rezando as crónicas maias que nos restam cerca de oito meses de vida, ou de vida neste mundo como o conhecemos, é um daqueles momentos em que me acho em alturas de introspecção e meditação. Não meditação transcendental nem qualquer outra forma mais ou menos zen de relaxamento. Isso enerva como o raio que o parta e além disso não me quero sentir relaxado. Não posso, não devo e nenhum de nós devia permitir-se, em momentos históricos decisivos como o que penosamente atravessamos, um momento que seja de relaxamento.
É de lamentar quando pessoas que nos chamavam a atenção para coisas que estavam a acontecer, pessoas informadas, coerentes e esclarecidas, optam por fechar os seus espaços de intervenção. Não é de agora que o blogue em causa estava já algo inactivo. Perante os sinais de retoma de actividade, animei-me numa expectativa de reavivar um espírito que, não há muito tempo, grassava pela blogosfera. Tudo isso hoje foi negado. Não ponho em causa os motivos ou motivações para uma decisão destas, mas lamento profundamente.
A bloguista em questão foi convidada pelo Cirrus Minor para com este blogue colaborar, na medida que entendesse como possível. O convite mantém-se. Sei que até agora não houve resultados dessa associação, não por vontade minha, mas sei igualmente que os poderia haver e proveitosos. Para já, fica o lamento pelo desaparecimento do Pronúncia do Norte. Agora seria a altura em que mais se justificava a sua existência, mas, como já escrevi, não me cabe julgar motivos ou motivações. Nem as vontades dos outros.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

PÓS-FERIADO

Ilustração Marco Joel Santos
 


Chegamos, pois, ao pós-feriado. Ainda ontem estávamos todos felizes a ver os documentários da TV sobre o Salgueiro Maia e aquela malta toda que fez a revolução do 25 de Abril de 74 e ontem já foi dia de trabalho e hoje é 6ªfeira. Não, não quero um emprego bom, bom, bom, porque o que tenho já me dá trabalho que chegue. Mas acredito que desse jeito a muita gente.
Ora não me farto de ver os documentários sobre o 25 de Abril. Politiquices à parte, gosto mesmo. Para já, as imagens são a preto e branco e dão um encanto especial à coisa. Em qualquer país ocidental de então já se filmava a technicolor, mas em Portugal era a preto e branco e já era bem bom. Até fazia sentido, pois tínhamos na altura a mania de sermos um império em que a maioria da população até era preta. Embora fossem os brancos que mandavam. Outras coisas, outras loiças.
Por outro lado, gosto de rever imagens daqueles dias porque tudo o que mexia era entrevistado na rua – já na altura – mas isso nem era o mais importante. O importante é que o repórter de serviço estava sempre a fumar enquanto entrevistava e isso sim é que era liberdade. Até na proclamação da Junta de Salvação Nacional, se viam baforadas a sair por detrás das câmaras. Era um fartote de tanto fumar. Liberdade total.
Ora então passados 38 anos da data retratada, menos um do que tenho de vida, dou comigo a não assistir às cerimónias de comemoração do 25 de Abril. Evidentemente, já sei que o cavaco fez um discurso, o que, atendendo à sua condição mental, é obra de monta. Já para não falar em mexer os lábios de cera, o que inclusivamente deve ser doloroso. Já sei que o cavaco o ano passado se lembrou de que havia uma crise muito grave em Portugal, mas parece que agora imagina que tudo vai bem e na paz dos anjos. Evidentemente, não convidaram os desempregados deste país para as galerias do parlamento. Não porque tivessem medo da reacção dos desempregados, mas porque desempregado, por lá, já há muito. Isto na acepção de pessoa sem emprego, ou seja, pessoa que não tem função atribuída, ou ainda, que não faz a ponta de um caracol. Mas se os desempregados lá estivessem, tenho a certeza que a cera que reveste a estátua de cavaco derretia, porque os ânimos iam aquecer.
Por outro lado, a Associação 25 de Abril recusou ir às cerimónias oficiais porque não revêem o 25 de Abril nas políticas seguidas actualmente pelo nosso governo. Ora, não seria coisa mais fácil, porque, pela primeira vez, um governo de direita obrigou os seus membros a usar cravos na lapela. Cavaco, esse, que parece ser alérgico a cravos, levava um bem assente pin de um cravo na lapela. Caiu o Carmo e a Trindade! Ora os senhores da Associação 25 de Abril são a brigada do reumático! Ora que esses senhores, os capitães de Abril, querem apropriar-se da revolução! Ora mais umas coisas desagradáveis que por ali se disseram, inclusivamente uma coisa estranha que disse a juventude laranjinha, que foi mais ou menos que cada vez mais se cumpre o espírito de Abril quanto mais nos afastarmos dos seus desígnios. Ora esta última afirmação é de uma juventude partidária, ainda por cima laranjinha, por isso nem vale a pena comentar muito. Querem dizer que o branco é cada vez mais branco quanto mais escuro for. Coisa do género. Ouvi dizer que fugiram 30 doentes do Magalhães Lemos mas já apanharam 32. Só que nenhum era dos que fugiu. Esses refugiaram-se numa juventude partidária…
Quanto à brigada do reumático, é verdade, os senhores capitães de Abril, agora majores e coronéis – também era bom se passados 38 anos nunca tivessem sido promovidos – já não são assim tão novos e devem ter algum reumatismo. Quanto ao apropriarem-se da revolução, isso é que já não entendo. A revolução é deles! Foram eles que a fizeram, não o povo. Dizer que a revolução é do povo é giro, mas o que teve o povo a ver com a revolução? Foram os capitães de Abril que a fizeram, não precisam de se apropriar de nada, a revolução é deles e sempre foi e sempre, em boa verdade, será. O povo só levou com os resultados, pois também é certo que só assistiu pelo relato.
A liberdade dá para todos os lados. A Associação 25 de Abril resolveu, em liberdade, não assistir aos festejos e dizer porquê. Porque não se revêem no actual rumo da política nacional. É um direito que lhes assiste. Deputados e outra gente de direita apelidaram-nos de brigada do reumático e até o passos coelho se referiu a eles como querendo protagonismo. Assim tivesse ele um décimo do protagonismo e tomates deles naquela madrugada de 25 de Abril. Mas é também um direito que lhe assiste. Foi por isso que os capitães de Abril lutaram, pelo direito de se poder falar destas coisas em Portugal.
A mesma liberdade que a mim me assiste de, a quem assim tentou enxovalhar o testemunho vivo da luta pela Liberdade em Portugal, chamá-los de nazis e mandá-los para a real senhora que os fez, num dia triste, nascer para este mundo. Ainda hoje comeriam merda se não fosse a brigada do reumático, seus badamecos da treta!

segunda-feira, 23 de abril de 2012

OS ROTOS E OS ESFARRAPADOS

Ilustração Marco Joel Santos


É cada vez mais comum dar conta das mais diversas contradições na comunicação social. Nada que seja novo, uma vez que a comunicação social nos dá as notícias que, por um lado, pensa que queremos saber, e aquelas que lhe dão para nos dar a nós. Tal é assim desde o princípio da imprensa, e nunca há-de mudar. Mas nada melhor que ter um governo demagógico e ultra-liberal, como este que temos na União Europeia, para que as coisas assumam contornos ridículos.
Lembro-me que aqui há uns tempos, se dizia que países desenvolvidos, como a Holanda, não tinham TGV nem dele precisavam para nada. Agora, pelos vistos, na Holanda, um comboio fantasma, como aquele d’Os Cinco, embateu num comboio normal e fez uma catrefada de feridos. Era fantasma porque era um TGV e estava na Holanda e a Holanda não precisa de TGV. Duas questões assaltam-me à mão armada: como raio um comboio fantasma faz feridos, e como é que um país que é do tamanho do Alentejo precisa de um TGV, ainda que fantasma?
Dir-me-ão que a Holanda, apesar de pequena, é um país rico e pode, de facto, ter um TGV. Aliás, tendo em conta que tem um aeroporto muito grande em Amesterdão e um porto enorme em Roterdão, o TGV faz todo o sentido, pois pode transportar pessoas e passageiros para fora da Holanda, ou seja, para a Alemanha. Evidentemente que o aeroporto de Frankfurt e o porto de Hamburgo são apenas para enfeitar.
A Holanda foi o país que mais alinhou nas críticas contra a Grécia, Portugal, Itália e Espanha, pela boca do seu primeiro ministro Mark Rutte, por serem países de malandros que não querem trabalhar e cujas famílias se endividaram de uma forma escandalosa. E, em abono da verdade, pelo menos no segundo caso, quem pode dizer o contrário?
Agora que se descobriu que as famílias holandesas são as mais endividadas da Europa, e que o défice afinal é igual ou maior ao dos países do sul malandros e gastadores, e que o primeiro ministro holandês, um liberal de meia tigela já foi com os porcos, é caso para dizer que bem podiam meter o moralismo num sítio onde o sol não brilha e só não entram moscas por causa do esfíncter.
Por outro lado, é de certa forma interessante que países que antes não sentiam a austeridade da forma que impuseram a outros, seus correlegionários, afinal, na desgraça da agiotagem internacional, a sintam agora. Não, não é um sentimento de “com o mal dos outros posso eu bem” ou, pior ainda, “já que estou mal, que todos estejam pior”. Oxalá nenhum holandês se tenha de humilhar, na sua dignidade, como os portugueses e gregos têm feito. Oxalá não seja nunca necessário um Programa Contra a Fome na Holanda, como parece que vai ser implementado em Portugal.
Mas aquilo que não posso esquecer é que grande parte dos agiotas que têm levado milhões de famílias à miséria em Portugal, na Grécia e na Espanha é, precisamente, holandesa. E outra coisa surge disto tudo.
Ninguém nega as cavaladas, as imensas incompetências, a irresponsabilidade dos governantes portugueses, mormente Sócrates e Cavaco. Um, o pai das PPPs e o outro o que mais as usou. Um, o pai do crédito para a torradeira e o outro o do crédito para o aspirador. Um, o pai do monstro, o outro o que o alimentou. Mas convençamo-nos de uma coisa: esta crise é europeia, senão mundial. E a culpa não é outra senão a ambição, a ganância, a negação da sociedade, a apologia do individualismo, ao invés da sociedade, dos objectivos sociais, que somos todos nós.
Diz o esfarrapado ao roto: estás nu, pá…

quarta-feira, 18 de abril de 2012

LIBERALISMO



Em voga está a corrente que afoitamente classifica este governo que agora temos de liberal, ou, na melhor das hipóteses, de neo-liberal. Mas será que quem assim advoga realmente sabe o que é o liberalismo? Será ajustado ideologicamente classificar assim o governo de Portugal?
As origens do Liberalismo remontam ao autor e filósofo inglês John Locke (1632-1704), que, para além de numerosos tratados filosóficos, escreveu dois Tratados Sobre o Governo Civil. A ele, essencialmente, se devem algumas das noções do Liberalismo, como o de propriedade privada e o questionar do direito divino dos soberanos. Filosoficamente, Locke defendia que o ser humano nasce sem ideias inatas, sendo uma tábua rasa pronta a ser preenchida. Por tal razão, defende a igualdade de todos os seres humanos. Até aqui tudo bem, mas Locke procura filosoficamente sustentar a escravatura e defende que o poder político apenas pode ser exercido por uns quantos esclarecidos – e quanto a igualdade dos seres humanos estamos conversados. Para Locke, todos somos iguais, ainda que uns poucos possam ser mais iguais que uns poucos mais outros, e o resto são escravos.
Com Adam Smith (1723-1790), o Liberalismo como ideologia político-económica alcança contornos mais bem definidos. Smith defende, na sua obra maior, “Uma Investigação Sobre a Natureza e a Causa da Riqueza das Nações”, que a economia é impulsionada exclusivamente por esforços individuais com vista a satisfazer o auto-interesse de cada indivíduo. Por seu lado, Stuart Mill (1806-1873) admite governos déspotas em países atrasados, entre outras coisas.
O Liberalismo, como corpo doutrinário político, social e económico inteiramente formado, defende essencialmente:
·         A liberdade individual, conducente à livre iniciativa económica; o Liberalismo rejeita a noção de grupo ou equipa, e a sua máxima “trata uma pessoa como um indivíduo e não como parte de um grupo” é disso elucidativa;
·         Exclusivo da propriedade privada face à propriedade pública e/ou comunitária;
·         Individualismo económico – é visto como uma forma de alcançar objectivos – mesmo os mais desfavorecidos são beneficiados porque se esforçam para melhorar a sua condição;
·         A entrega da condução do Estado Constitucional aos detentores dos meios de produção;
·         Completa exclusão do Estado da economia, sendo para este reservado apenas o papel legislativo, sendo que o regulador económico é representado apenas pelas leis de mercado;
·         Sufrágio reservado às elites financeiras e económicas, detentoras do exclusivo político;
Quando se dá a Revolução Francesa, em 1789, o Liberalismo tem a sua primeira grande oportunidade de expansão fora do mundo anglo-saxónico. Mas Rousseau não defende o Liberalismo político. Os ideais da Revolução aproximam-se dos ideais liberais, mas rejeitam o seu primado político. Para os revolucionários franceses, todos são cidadãos e todos, sem excepção, devem participar politicamente – o sufrágio torna-se universal. Interessante será que a condição de igualdade entre todos os cidadãos agradaria, por certo, muito mais a Marx do que a Locke ou Mill.
Isto é o Liberalismo. Isto é o que os portugueses que referem tantas vezes a perspectiva liberal deste governo, estejam a favor ou contra essa perspectiva, deviam saber. Podemos, num exercício puramente académico e altamente especulativo, verificar a situação, ponto a ponto, do governo português face às premissas principais do Liberalismo.
Assim, em Portugal tem-se apelado, cada vez mais, ao empreendedorismo. Mas não esqueçamos que, basicamente, essa dimensão económica esconde, por vezes e das mais das vezes, arriscaria eu, o individualismo ou mesmo o egoísmo económico. Face aos valores comunitários que sempre imperaram na sociedade portuguesa, em que a identificação de um indivíduo no seio do seu grupo sempre foi essencial, pode vislumbrar-se uma mudança de paradigma do social-democrata para o liberal, de facto.
No que respeita à propriedade, o Liberalismo defende que esta deve ser exclusivamente privada e não pública. A que assistimos na actuação deste governo? À alienação, onerosa ou não de grandes partes do património do Estado. As privatizações, aliás, têm sido catastróficas para a economia nacional, uma vez que o estado tem feito investimentos avultados para desenvolver negócios lucrativos (mormente na energia e água), para depois os entregar a privados. Mais um ponto liberal deste governo e dos que o antecederam? Até certo ponto. Mas há uma inversão de papéis quando se assiste ao grosso do investimento por parte do Estado em empresas vendidas depois em ponto de pleno funcionamento, ou seja, o investimento privado não é estrutural, mas conjuntural, ao contrário do que defende a doutrina liberal.
Já me debrucei sobre o individualismo, mas convém referir que a visão liberal de individualismo, que pode, de certa forma, ser ligado à de liberdade (não no sentido colectivo mas estritamente individual) não implica a liberdade política ou social. Apenas a económica. Para se ser um cidadão de pleno direito, num estado puramente liberal (coisa que nunca existiu e facilmente se provará nunca poder existir), tem de se ter propriedade considerada suficiente para tal. Ou seja, a liberdade política e social só se atinge depois de ultrapassadas as barreiras censitárias. Neste aspecto, estamos longe, em Portugal, de tal situação. Pelo menos para já. O sistema social e político liberal assemelha-se, em certos aspectos, às monarquias feudais da Idade Média, nos termos estritamente políticos e sociais – não no económico.
A entrega da condução do Estado aos detentores dos meios de produção (no sistema económico denominado por capitalismo, os “capitalistas”) é uma realidade portuguesa desde há longos anos. Sócrates funcionou ao serviço de um conjunto de lobbies empresariais. Passos, como toda a gente sabe e finge que desconhece, é um pupilo de um dos homens com mais ramificações empresariais em Portugal, Ângelo Correia, um homem cujos negócios principais, não por acaso, talvez, estão na esfera dos negócios inteiramente subsidiados pelo Estado (Lixo, Água, Energia renovável, etc.). Não é um grande exercício de imaginação supor que Passos esteja efectivamente ao serviço dos detentores dos meios de produção, ou pelo menos alguns deles.
A completa exclusão do Estado da economia é uma utopia. Nenhum país o conseguiu até agora e nunca o irá conseguir, por razões demasiado óbvias que não interessa aqui escalpelizar. Mas ideologicamente, podem fazer-se aproximações razoáveis a esse objectivo, e exemplos desses Estados são, por exemplo, os EUA e a Inglaterra. Nos antípodas deste estado de coisas, temos países socialistas moderados, como a Suécia e restantes nórdicos, com um peso enorme do Estado na economia. A questão da aproximação desse objectivo é inequívoca no que respeita aos princípios ideológicos e sociais – particularmente estes – deste governo. Os cortes sociais são muitos e variados e adivinham-se movimentações para a privatização da Educação e Saúde.
O sufrágio, em Portugal, é universal. Até mais que isso, pois até alguns mortos e enterrados têm direito a voto. Não será fácil, seja a quem for que ocupe um governo em Portugal, revogar esse direito, em nome de seja que imperativo seja. Mas temos de convir que a nossa tradição democrática tem poucos anos. Uns poucos de República em que até Sidónio Pais revogou esse direito e desde o 25 de Abril de 1974. Estaremos assim tão preparados para resistir, se esse for um objectivo de um governo – em abstracto, não especificamente este – revogar o sufrágio universal? Se calhar vai depender de alguns factores mais ou menos exógenos, mas vale a pena pensar e acautelar essa situação. Digo eu…
Portanto, será este governo liberal? No sentido clássico do Liberalismo, sim, quereria ser. É liberal, o mais que pode. Só penso é que devemos todos saber porquê e não atirar chavões para o ar. Aqui expus as razões pelas quais este governo – e atenção, os anteriores igualmente, mormente o de Sócrates – é uma aproximação ao liberalismo. A ausência de estímulos governamentais ao crescimento económico e combate ao desemprego é a maior marca de um governo liberal. E essa é indelevelmente a marca do nosso governo. Resistirá muito tempo a rejeitar o liberalismo? Provavelmente não. Esperemos, na minha singela opinião, que não.

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Uma Aventura "noutro" Sítio Errado

Uma Aventura no Sítio Errado de Isabel Alçada, Ana Maria Magalhães Sinopse (retirada do site da Editorial Caminho, de acordo com o AO) Esta Aventura decorre numa quinta misteriosa e isolada. Excepcionalmente, não se identificou a localização para que os leitores possam imaginar o cenário na zona que desejarem. As personagens viajam de comboio, adormecem, e quando acordam a estação onde deviam apear-se já ficou para trás e, por isso, acabam por ir parar ao sítio errado, a dita quinta. Gente exótica, um festival de magia, o dono da casa, que na sequência de uma agressão fica amnésico e toma o Pedro por seu filho, ruídos na noite, enigmas para desvendar, passagens secretas, tudo se conjuga para que as surpresas se sucedam a um ritmo alucinante até ao último capítulo. Um livro excelente para despertar ou aprofundar o gosto pela leitura, na escola ou em casa.
Uma Aventura noutro Sítio Errado de Malena Sinopse (imaginária, de Uma Aventura noutro Sítio Errado, em desacordo com o AO) Esta Aventura decorre num Ministério nada misterioso mas cada vez mais isolado. Excepcionalmente, não se identifica a localização porque os leitores conseguem, perfeitamente, saber qual o cenário, o edifício, a rua e a cidade em que tudo se vem passando. As personagens viajam de automóvel do Estado, com motorista, são transformadas em zombies, acabando por ir parar ao dito Ministério. Gente estranha, com hábitos pouco condizentes com as funções desempenhadas, pareceres pagos a peso de ouro que não foram terminados, conversas que deveriam ser públicas mas se mantêm secretas, a constituição de uma empresa que constrói escolas de luxo onde depois não há dinheiro para fotocópias, alterações aos currículos feitas à medida do orçamento, exames, muitos exames, ministros que ficam amnésicos e se esquecem daquilo que defendiam antes de serem nomeados, tudo num ritmo alucinante mas que nunca mais chega ao último capítulo. Um "livro" excelente para despertar ou aprofundar a sua raiva pela política educativa institucional, na escola ou em casa.