terça-feira, 1 de maio de 2012

O POLÍTICO INTRANSPONÍBAL


Ilustração Marco Joel Santos


Costuma dizer-se, pelas esquinas dessas cidades e vilas, aldeias e lugarejos, que Portugal é um jardim à beira-mar plantado. Eu discordo inteiramente. Jardins plantados junto ao mar não vingam, a água salgada mata-os. Ainda se fosse um mangal à beira-mar plantado, percebia melhor, pois os mangais são resistentes à água salgada. Além disso, seria mais digno de um povo que elegeu o manguito como gesto nacional. Além do mais, se Portugal fosse um jardim, os governantes de Portugal seriam, por consequência, jardineiros. Ou pelo menos pessoas que não têm o mínimo jeito para podar bonsais mas insistem em torturar plantas.
A verdade é que já há muito tempo que não somos governados por nenhum jardineiro. Desde D. Dinis, amante de pinheiros bravos e poesia cancioneira. Também não somos governados por poetas, mas que eles se ajeitam com a letra, há que convir. Aliás, nos últimos anos, qual nação positivista, saída directamente de um qualquer exaltado sonho de Auguste Comte, temos sido governados por técnicos. Por cientistas, quase. Por, como lhes simpaticamente chamam, tecnocratas. Um par de engenheiros, outro par de economistas, e um par de lagostas a cada um que nem fazem falta ao cardápio.
Um dos mais renomados economistas portugueses e europeus, quiçá do mundo e mesmo do submundo para aquém vida e além morte (é preciso nascer duas vezes), e do submundo do crime organizado também, é o nosso excelso presidente Cavaco. Foi nosso ministro das finanças dois anos, nosso primeiro-ministro dez, e prepara-se para ser nosso presidente da República mais quatro, ameaçando constantemente os mais argutos com o cumprimento dos dez anos de sentença a que foram votados. Ora, perfaz isto um total de 18 anos no governo da Nação, e de lá sairá, com alguma sorte para os demais, com apenas 22 anos de governo.
Um jornaleco malicioso, um tal de Jornal de Notícias, veio na edição de ontem fazer uma série de insinuações sobre a honorabilidade do nosso excelso presidente enquanto supostamente ligado às actividades mineiras do BPN, Banco de Políticos Nefastos. Tal como urgia, Cavaco não demorou a emitir um comunicado, através do site da presidência – a sua – a “endireitar” alguns factos que esses perigosos esquerdistas do Porto ousaram deturpar em prejuízo do homem que está sempre certo e que nunca se engana. Podem ler O Comunicado da Presidência aqui.
Ora, eu li o comunicado, pois sou uma pessoa muito interessada nestas coisas, bem informado e até posso dizer que, sem desprimor, perco tempo a mais com estas coisas. E há alguns pontos que quero ressalvar, e que penso que dizem muito sobre o homem mais honesto de Portugal, o excelso presidente Cavaco. Depois de afirmar que o presidente nunca teve qualquer relação com o BPN, não lhe fez compras nem vendas, nem sequer tinha qualquer tacho no Banco de Políticos Nefastos, o ponto 1.4 é deveras incomodativo. A certa altura pode ler-se “Contrariamente ao que tem sido afirmado, as aplicações feitas pelo conjunto dos bancos das poupanças do Prof. Cavaco Silva e de sua mulher não se têm traduzido em ganhos, mas sim em perdas…”. Começa a perceber-se como é que Cavaco não tem dinheiro que chegue para as despesas, mesmo com a parca reforma de 11.000 euros. O homem ainda anda a pagar as perdas que ele próprio e a desvairada da Maria sua esposa andaram, ao longo dos anos, a coleccionar em vários Bancos!
Depois, mudando a agulha para o ponto 2, ficamos a saber que a Coelha, afinal, é um negócio perfeitamente lícito e nada teve de anormal. A não ser… Surpresa! Pois é, afinal, o negócio da Coelha, a residência de férias do presidente no Reino de Sua Majestade Allgarve, não só não tem nada de mafioso por parte do nosso honestíssimo e excelso presidente, como ainda este ficou a perder no pagamento da Sisa! Pode ler-se “O Prof. Cavaco Silva está mesmo convencido que pagou mais do que lhe competia pagar, …”. Ora porra. As Finanças enrolaram o presidente! Mais ainda, Cavaco “… tem seguido, até aqui, a prática de não reclamar das liquidações feitas pela Administração Fiscal.”. E é aqui que a coisa descamba para o pornográfico. Não só enrolaram o Cavaco… As Finanças f*deram-no bem e ele nem abriu o bico!
O que dizer de tudo isto? É triste. O homem anda ainda a cobrir perdas de investimentos financeiros que fez, e isso até é aceitável para mim, que sou economista amador, ao estilo do tipo que tortura plantas mas não percebe da poda. Mas para o mais renomado economista português, da Europa, quiçá de todo o Boliqueime? É deveras triste. Ainda por cima, está sempre certo e nunca se engana. Excepto quando é para perder massa, aí é um mãos largas! Além do mais, pagou Sisa a mais. Mais uma vez, um homem tão esclarecido e ainda por cima tão honesto como Cavaco, que tem um grau de honestidade intransponíbal, pois temos de nascer duas vezes para lá chegar – nós, os vulgos mortais que se enganam e que às vezes não estão certos – não podia exigir de uma instituição pública o mesmo grau de honestidade? Não, calou-se bem caladinho, quiçá com medo que as Finanças o julgassem, do tipo “Ai é? É assim? És espertinho? Já vais ver como mordem os cães das Finanças! Vomita para cá as últimas 91 declarações de IRS que entregaste!”.
Eu, na realidade, já sabia que Cavaco é um desastre ambulante. Uma nulidade armada em tecnocrata que governou com imensa ignorância um país banhado, não pelo mar junto do qual se plantou o jardim, mas pela bonança dos fundos europeus, e os esbanjou ingloriamente, desperdiçando a oportunidade de fazer evoluir o país. Já o considerava o mais danoso governante português, por duas razões: pela que já escrevi atrás e porque é o mais duradoiro e aquele que sem dúvida teve mais tempo e oportunidade de fazer estragos. Sérios estragos. Mas nunca pensei que fosse burro o suficiente para admitir a sua incompetência em termos financeiros num comunicado oficial da presidência. Está bem que é a sua presidência, e dali esperam-se bovinos disparates, mas nem tanto. E o modo como se sente burlado pelas Finanças e se calou bem caladinho… Deve haver por aí muita gente, que afirma que duas pessoas juntas já são uma manifestação (um casal com a esposa grávida é um comício) – e a este assunto voltarei, podem estar certos – que pensa que ele fez bem e todos devemos fazer o mesmo, a bem da paz e da coesão social…
Aníbal, o Intransponíbal, afinal, é um cepo. Passou de eminente economista a gajo que perde dinheiro nas jogadas dos bancos. Passou de pessoa que está sempre certa e que nunca se engana a vítima de bullying das Finanças… Salve-se a sua estatura moral, a sua honestidade. Salve-se Cabo Verde e as Caimão, e por certo até ele se perdoa por passar por estúpido na Nação de que é a primeira triste figura…

10 comentários:

  1. O Aníbal devia fazer como aquele outro a quem se quer assemelhar: Pôr a Maria a criar galinhas e coelhos nas traseiras da residência oficial para poupar e mandar remendar os fatinhos que seriam aproveitados, posteriormente, para fazer calções para os netos!
    Porra pró Aníbal!

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  2. Cirrus, ele nunca se engana... não quer dizer que nunca é enganado, lol.
    Ele nunca se engana, mas sabe enganar os milhões de otários que lhe puseram a cruz.

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  3. Malena, coelhos parece-me que já cria. Galinhas também, pelo menos fala-se nas cristas.

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  4. Cat, não sei se foi apenas nas cruzes que ele enganou milhões de portugueses. Tenho sérias dúvidas.

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  5. Não li o comunicado, mas confio em ti (tenho que admitir que não é algo que costumo fazer antes de formar uma opinião mas estou a assumir o papel de "seguidor" fiel).

    Eu a pensar que ias aproveitar para rematar com o estado em que nos adiantou o país. Mas depois lembrei-me - dado que já não passo aqui há algum tempo - que não são assim os melhores textos e respectivas conclusões.

    Pessoalmente prefiro "otário" a "cepo" (este termo leva-me sempre para o futebol e de futebol estamos falados ao que se refere a este ano) mas também é aceitável. Até porque é um termo mais adulto.

    Falando mais a sério - como se o que disse atrás não fosse sério e não o sentisse... -, é algo que me ocupa, em demasia, o pensamento. O que podemos nós fazer realmente para alterar isto tudo - a mediocridade e o chico-espertismo desta malta?
    Esqueçamos as manifs pelas principais avenidas ou em frente a câmaras municipais. Refiro-me ao sentido estrito e não superficial da questão. Como combater estes gozões?
    Any sugestions?

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  6. A minha sugestão é lenha. Mas depois acusam-me de terrorismo.

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  7. Cirrus, meu querido... a politica é como as omeletes. Metes la o que quiseres, bates até não poder mais, mas é sempre uma omelete. A M**** que tem estado no puder só tem mudado na cor da gravata. Ta dito.

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  8. Maxx, por muito que digamos isso, em Portugal, não está provado que assim seja. Não podemos provar isso.

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  9. Pior do que isso que disse, é estar hoje a tentar perceber para onde ir, e ver toda a Europa em desespero. Ainda hoje me ligou um colega de trabalho, que reside no Monaco e estava desesperado, pois ainda ontem elegeram novo Presidente e já estão a prever novas taxas... Ok, desculpa divagar... mas esta vida em Portugal não é a que quero para o meu filho, e a da Europa também não. De todos os estudos que fiz, o melhor ainda é a holanda, mas até lá a crise esta a chegar... Enfim, o desespero é meu...

    Quanto a Portugal, meu querido Cirrus, está tudo uma merda. Veijo os meus pais, e as dificuldades que eles passam e trabalharam uma vida inteira, vejo o meu passado, vejo em minha volta, e nada funciona. Nada. Sinceramente, do Estado consegui ganhar uma batalha, mas o que poucos sabem é que me tive de unir a eles, e foi alguem internamente que me disse o que , e como tinha que fazer... (é triste, pois as oportunidades deveriam ser gerais).
    Mais, o discurso de chamados politicos, que é triste. E se não tenho lido muito ultimamente, lembrome-me que o Sr. Cavaco disse um dia que a sua reforma iria ser de 1200 euros... Que palhaçada. Como me explicas tu, que a minha mae tenha sido operada 5 vezes, que esta acamada, e que sempre que se tenta "levantar" piore e não é reformada porque para os medicos do Estado, ainda pode trabalhar com os 65 anos de idade que tem. Injusto, estupido e só mesmo em Portugal, aquele pais que podia ser grande, que tem um clima Californiano e que foi um Harém para muitos e hoje um paraiso fiscal de corrupção para outros.
    A vida esta para quem pode. E sim, pode-se provar.

    Bjocazz

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  10. ahahahah

    Grande Cirrus. Gosto assim, das grandes verdades escritas sob a forma de humor sarcástico. E quando eles se apressam a desmentidos, está tudo dito...

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