Escrevo
em Espanha, minutos depois da Espanha ter ganho a Portugal mais uma
vez no jogo da moquinha. Pode dizer-se, por isso, que não estou nem
nos melhores dias nem nos melhores locais para escrever. Mas até
apetece e pronto. E se me perguntam o que faço eu em Espanha,
respondo que nada têm a ver com isso. Mas estou de férias. E estou
em Espanha porque decidi poupar e não ficar em Portugal.
O
dia de ontem foi dia de manifestações um pouco por todo o lado, até
em Nisa, onde almocei e tive pelo menos o lampejo de me juntar ao
espírito da coisa. Sim, se estivesse em casa, com certeza estaria
nos Aliados. Sim, decerto me manifestaria em protesto contra este
governo. Por certo me juntaria aos milhares (um milhão?) de pessoas
que juntaram a sua voz aos que andam a protestar há anos a fio. E
que bastas vezes são acusados de pessimistas, bota-abaixo e coisas
ainda menos simpáticas, como perigosos esquerdistas ou talibãs.
Mas, mesmo assim, iria.
Já
não escrevo daquilo que escrevi sobre o “engenheiro” e seus anos
de algo que pode considerar-se, muito vagamente, como governo. Recuo
apenas um ano e meio, e ao que escrevia e protestava contra uma certa
ala de um certo partido que ameaçava tornar-se governo deste país.
Tentei alertar, tentei sensibilizar, tentei desmistificar. Tentei
lutar. Obviamente, como eu, muitos, de entre todos muito poucos. 85%
dos votantes portugueses e mais 45% de abstencionistas decidiram dar
a sua confiança a um governo externo.
Internamente,
uma maioria absoluta dos votantes e 45% de abstencionistas deram a
vitória à JSD. Foi a maior derrota política da minha vida, e não
concorri sequer a nada. E já tinha tido várias, como a eleição do
rei do cavaquistão para presidente e antes para primeiro ministro.
Ou a eleição do “engenheiro”, ou a eleição de Bush. Mas esta
doeu particularmente. E doeu essencialmente porque sabia o que aí
vinha, e até o disse e o discuti, aqui na net, na minha vida pessoal
e na minha vida profissional, o que me custou alguns dissabores.
Nunca desisti, nunca me calei.
Hoje,
finalmente, vi uma pequena parte do meu povo aperceber-se do que eu
tinha antevisto há ano e meio. Dez por cento da população do meu
país abriu os olhos. Mas é, por enquanto, apenas um décimo.
Precisam-se de mais manifestantes, de mais pessoas nas ruas,
precisa-se de um povo.
No
entanto, tenho um sabor amargo na boca. Nos últimos tempos, têm-se
multiplicado os discursos de reprovação deste governo, mas agora
até por pessoas que o apoiaram incondicionalmente – há ano e
meio. Pessoas como Marcelo, Ferreira Leite, Mira Amaral e outros
tantos... sinto asco. Sinto nojo.
Mas
o que mais me impressiona são os anónimos, a multiplicação de
textos por essa net fora, nos últimos dias. Pessoas que admitem até
terem apoiado a JSD nas eleições, e que agora estão desiludidas.
Pessoas que não apoiaram mas que agora decidiram protestar. Há
textos a mandar o governo ir-se foder agora!
Agora???
Onde andavam há três anos e meio, quando o “engenheiro” ganhou
as eleições? Onde andavam há ano e meio, quando esta cambada que
não é melhor ganhou as eleições? Porquê agora? E, infelizmente,
é fácil responder. Porque agora, foram mordidos no traseiro pelo
tubarão. Porque agora lhes tiraram dinheiro do bolso. Porque agora é
que se aperceberam que estes jotinhas queriam ser liberais, mas não
podem, porque são obrigados a subir impostos, mas os imitam, quando
destroem todos os direitos sociais de cada indivíduo. Agora???
Agora???
Onde andavam quando os pensionistas, incluindo aqueles como a minha
mãe, que ganham 200 euros, ficaram sem aumento e sem subsídio de
férias e de Natal? Onde andavam quando tiraram os subsídios de
Natal e de férias aos funcionários públicos, a maior parte sem
aumentos desde há cinco ou seis anos e com carreiras congeladas?
Onde andavam quando Paulo Macedo destruiu o Serviço Nacional de
Saúde? Ah, provavelmente não o usam... Onde andavam quando Crato
decidiu destruir a escola pública? Também não utilizam... Mandam –
agora – foder o governo? Pois eles já os estão a foder há muito
tempo. Não sentiram? Foi preciso uma taxa subir 60% para o sentir?
Uma taxa, que, finalmente vão experimentar pagar? Agora? Agora que
temos este país destruído? Agora?
Precisamos
de todos, precisamos de gente nas ruas, precisamos de pressão,
precisamos, se calhar, de revolução. Precisamos até de vocês. Mas
também vos digo, só não vos mando foder porque fodidos já vocês
estão. Só que agora, estão acordados. Bem vindos ao mundo real, ao
país das fodas!
E eu que até gosto de sexo!!! Ora porra!
ResponderEliminarÉ isto, Cirrus, as pessoas acomodam-se a às vezes acordam tarde de mais!!
Não é tarde de mais. É tarde. E como tarde que é, pode salvar-se aquilo que se pode salvar. E não forçar governos a demitirem-se que é bonito. Bonito é evitar que eles lá cheguem.
Eliminar(Não posso deixar de exprimir a minha total concordância para com o essencial deste post. É de homem! Mas... tem calma. Vê o filme e não tentes entender muito o guião. Descansa, afinal é uma serie, e tem mais episódios... Ah! E já agora, suspeito que num dia de frio e com bola na TV, ficava esta iniciativa por metade...)
ResponderEliminar;)
oops, eu espero sinceramente que não. Espero que esta manifestação tenha sido participada por convicção.
EliminarO protesto do 15 de Setembro foi uma manif da classe MEDIA (Alta, mediamedia e baixa) salpicada por alguns pobres e por uns tantos marginais.Sem ricos mas quase tambem sem pobres.....
ResponderEliminarFoi a expressão do povo portugues no seu melhor, ou seja o comportamento tipico das angustias da pequena burguesia, que no fim olha para o mundo atraves e só de mais Direitos, ou seja reclama por mais ESTADO.
O que é importante para Portugal não é mais estado, mas sim mais liberdade e Iniciativa individual!!
Liberdade em todos os parametros, não só meramente formais e civis, mas essencialmente economicos e laborais.
Reviralho
Caro Reviralho, obrigado pelo comentário. Efectivamente pode ter razão, mas também pode não ter - e isto por um aspecto muito simples: a classe média É pobre em Portugal.
EliminarOs direitos por alguma razão o são, e ao contrário de outros países, a classe média portuguesa, a tal que considero pobre, deve perguntar, finalmente, o que pode o seu país fazer por eles e não o que eles podem fazer pelo seu país. Porque, de facto, é um país que até agora só sacou à classe média, as pessoas trabalhadoras deste país.
De qualquer forma, a visão liberal que defende não é a minha visão. Para já, e tal como o leninismo, parte de um princípio perigoso e que faz do liberalismo outra utopia: somos todos iguais. Quando houver um país puramente liberal no Mundo, então falaremos de liberdade aplicada ao individualismo - dois preceitos que estão nos antípodas da minha escala de valores. Mas respeito a opinião.
toda a gente tem direito a errar. Neste caso, foi nas urnas.
ResponderEliminarDylan, não me dou a esses luxos...
EliminarCaro Cirrus
ResponderEliminarO meu "camarada" Vladimir face aquele protesto aproveitava a tarde de sabado para escoar o stock do seu livro " Que Fazer " mas.....eu não acredito na classe media...ou seja da classe da sardinha assada em estilo fashion , dos festivais de verão, do xinelo no pé e unhas pintadas (até fica bem dá um certo estilo Louboutin), das caipirinhas ao longo da noite num bar tipo classic-nouveau de que tanto gostam.....prefiro 100 vezes os marginais já que os pobres não me seduzem...sendo que o problema não é da sua condição mas essencialmente meu.
Sobre a igualdade carissimo Cirrus não acredito..porque logo à partida somos todos diferentes.O Napoleão devia estar bebado ou com a josefina nos amassos quando mandou inscrever tal monstruosidade juridica e intelectual nos edificios publicos franceses.È uma equação impossivel, porque se bem virmos as coisas a igualdade é um previlegio só dos ricos e poderosos.Foi sempre assim e assim será.....
Então "Que fazer" ?
Já que não consigo ler livros nem tão pouco me dá gozo ir a manifs, pessoalmente vou bebendo uns Bushmills de preferencia velho, tento olhar para o que se passa à minha volta mas não vejo absolutamente nada...nem tão pouco quero ver o que quer que seja...
Obviamente que o problema é meu!Passar pelos pingos da chuva sem me molhar? Talvez!
Reviralho
Levanta questões interessantes. Para mim, a questão não é acreditar ou não na classe média. A questão é a sua existência. Que está, de facto, ameaçada.
EliminarQuanto à igualdade, é óbvio que somos todos diferentes, e por isso é que o apelo colectivista leninista ou o apelo empreendedorista liberal são utopias que dificilmente se realizarão. Nem 8 nem 80? Talvez, mas eu sinceramente gosto pouco de meios termos.
Quanto ao resto, não censuro quem aguarda o desfecho, seja ele qual for. Mas tenho outra atitude.