domingo, 13 de dezembro de 2009

A QUARTA DIMENSÃO

Imagem Google

Todos os anos há Natal. O que lhe tira brilhantismo. Aquilo que realmente se saboreia não acontece todos os anos. Como um Mundial de Futebol ou a passagem de um cometa, aquilo que realmente interessa não acontece todos os anos. Torna-se banal. E tem outro efeito perverso. Lembra-nos, ano após ano, que a quarta dimensão, o diapasão da existência, se esvai por entre os nossos dedos, se esgota, drena as nossas energias e cada vez mais nos torna mais chegados ao retorno. O Tempo. A quarta dimensão, a única que não pode ser manipulada. O cerne de toda a existência, aquilo que nos permite evoluir, viver, existir, morrer.

O Tempo é menosprezado. Havia uma civilização antiga, na América Central, chamada de Maias, que era obcecada pelo Tempo. Faziam calendários com uma precisão absolutamente notável. Tinham três calendários engrenados, cujo funcionamento em conjunto era preciso a um ponto que os nossos relógios atómicos ainda só agora começam a roçar. Porquê? Porque tinham os antigos Maias esta obsessão com o Tempo? E porque deve esta questão ser colocada desta forma e não ao contrário? E porque não somos nós obcecados com o Tempo? Na verdade, a Humanidade sempre se apercebeu da verdadeira natureza do Tempo, ou seja, da sua inexorabilidade, do seu curso inalterável, uma fatalidade para uma espécie que pensa dominar o mundo em que vive.

Onde nos levou a percepção da inexorabilidade do Tempo? Poder-nos-ia ter levado à constatação de que a vida é extraordinariamente preciosa, que vale a pena viver, que a dádiva do Tempo que passamos por cá é crucial. Mas não foi essa a direcção que seguimos quando nos apercebemos da fatalidade do Tempo. Pelo contrário, tratamos de arranjar algo que desafiasse o Tempo, que fosse tão extenso como ele, mas ainda mais absoluto, ainda mais poderoso. Surgiu a ideia dos deuses, e de Deus. Quem é cristão habituou-se a crer na vida eterna, quer seja no céu ou no inferno. Não está aqui em causa a classificação destes conceitos, mas antes o conceito de vida Eterna. O que é ser eterno? O que significa? Há quem diga que este é o derradeiro segredo religioso, a verdadeira essência dos ritos, perceber a eternidade. Mas, na verdade, o que é esta ideia, este conceito de vida Eterna, senão um gigantesco desafio ao Tempo? Não serão todos estes ritualismos, todas estas religiosidades, todas as religiões, ao fim e ao cabo, apenas tentativas desesperadas do Homem no sentido de controlar a única coisa que nunca estará sob seu domínio?

Será o Tempo... Deus? O Tempo é Deus? Será uma ideia disparatada, dirão. Mas talvez não. Porque será que o Tempo não pode ser Deus? Qual é o nome de Deus? Segundo os escritos, é O que É, ou Aquele que É. E quem mais poderá ser, não sendo, senão o Tempo? Pois, se no nosso imaginário, Deus não pertence a este mundo, ou seja, não pertence a nenhumas das dimensões físicas que dominamos, onde existe Deus? Só pode existir na quarta dimensão, o Tempo. Serão Deus e o Tempo a mesma coisa? Talvez sim, mesmo teosoficamente considerando a existência de Deus, este parece estar muito mais ligado ao Tempo do que se pensa. Simultaneamente, levados ao extremo do racionalismo, a própria ideia de Deus, que é uma ideia humana, não tem uma condição física, não existe fisicamente, não cabe nas três dimensões. Só pode existir na quarta dimensão. O mesmo acontece com todas as ideias, estão todas na dimensão do Tempo. E é isto que verdadeiramente aterroriza o Homem. É ter a noção, ainda que remota, que tudo o que pensa é Tempo, tudo o que o rodeia é terreno e perecível, mas o Tempo é absoluto, seja em que local for. Logo, o Tempo é a única dimensão da nossa existência que é omnipresente.

Mas será o Tempo poderoso ao ponto de influir não apenas no mundo das ideias, mas também no mundo físico? Congele-se o Tempo. O que ficará? Será que o universo pode resistir sem o Tempo? Uma acção, física ou psíquica, seja ela qual for, não está dependente do suporte físico em absoluto. Se tal fosse verdadeiro, não conseguiríamos ter um pensamento, uma Ideia. Mas não pode existir sem o Tempo. No fundo, sem ele, não há condições de vida, nem mundo onde viver. Tudo se resumiria a um brevíssimo momento fugaz de existência. As manifestações físicas da natureza só se manifestam devido ao Tempo. Logo, o Tempo é omnipotente. É o Tempo que constrói incessantemente o mundo que vemos a cada momento que passa, para o destruir no momento seguinte e assim consecutivamente. Por isso temos apenas recordações do passado, pois o mundo físico em que essas recordações se dão está destruído, mas não o Tempo, em cujo seio depositamos as ditas recordações e demais Ideias. Se é no Tempo que se acumulam as Ideias, as recordações, os pensamentos, até os sonhos da Humanidade, isso não faz com que o Tempo seja omnisciente? Não é no Tempo que está acumulado todo o Saber? Mesmo que as pessoas esqueçam aquilo que foi aprendido há milhares de anos, o facto permanece: esse conhecimento existe e está perdido no Tempo. Logo, está no Tempo, onde todas as coisas regressam, afinal.

Omnipotente, omnipresente e omnisciente. Têm dúvidas? Tem dúvidas que o Homem quis criar um ser todo-poderoso, chamado Deus, por se recusar a aceitar a sua total dependência do Tempo, o verdadeiro Deus?

20 comentários:

  1. gostei!!! o tempo é soberano !! e quanto aisso ...nada a fazer.... tão manipulador que se relativiza na nossa cabeça a toda a hora !!

    bj
    Teresa

    e sendo assim, haja para aí um deus qualquer :)

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  2. O Tempo é o verdadeiro ditador da nossa vida, e ao mesmo tempo é ele que nos proporciona essa experiência. Logo, que necessidade há de procurar um Deus mais absoluto que este?

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  3. Pelo contrário, tratamos de arranjar algo que desafiasse o Tempo, que fosse tão extenso como ele, mas ainda mais absoluto, ainda mais poderoso. Surgiu a ideia dos deuses, e de Deus.

    sem dúvida uma das maiores falhas do ser humano, acreditar que haverá algo que poderá ser eterno, quando nem mesmo o universo é, nem tão pouco o tempo.


    Não serão todos estes ritualismos, todas estas religiosidades, todas as religiões, ao fim e ao cabo, apenas tentativas desesperadas do Homem no sentido de controlar a única coisa que nunca estará sob seu domínio?


    completamente, mas ainda ha pessoas que se chocam quando digo que as religiões não têm sentido de existir e confundem fé com religião, confundem a crença em algo maior que elas (o tempo) com a igreja.

    Será o Tempo... Deus? O Tempo é Deus? Será uma ideia disparatada, dirão. Mas talvez não. Porque será que o Tempo não pode ser Deus? Qual é o nome de Deus? Segundo os escritos, é O que É, ou Aquele que É

    para mim deus não é o tempo mas o tempo é deus. o tempo determina tudo, tudo esta ja detreminado enquanto passado e futuro se cruzam no espaço. para mim, o tempo tudo controla. até a nossa infima e insignificante existência. se realmente existe um deus (e nao deus o senhor das barbas) será o conjunto de toda a matéria e energia que compõe o universo, logo nós somos parte de deus. nos somos deus, no todo e em cada um de nós.


    Mas será o Tempo poderoso ao ponto de influir não apenas no mundo das ideias, mas também no mundo físico? Congele-se o Tempo. O que ficará? Será que o universo pode resistir sem o Tempo? Uma acção, física ou psíquica, seja ela qual for, não está dependente do suporte físico em absoluto. Se tal fosse verdadeiro, não conseguiríamos ter um pensamento, uma Ideia. Mas não pode existir sem o Tempo.

    o tempo foi o início e será certamente o fim. mesmo estando ligado a uma dimensão incapaz de ser descrita por nós, as leis da física indicam que tudo tem um fim. mesmo o tempo que parece ser eterno, terá um fim e não restará nada mais que o vazio, o nada... acho que isso é o que verdadeiramente assusta os seres humanos.


    e tu bem sabes que deus é uma invençao do homem face à insignificância da sua existencia, de maneira a tentar encontrar um sentido para a sua vida, algo que lhe garanta que ha algo mais.

    o problema é que essa visao afastou o ser humano do seu verdadeiro potencial, da sua ligaçao com a natureza, da sua ligaçao com a sua propria essencia. em vez de se focar na vida e no Tempo que o constroi dia a dia, foca se numa outra vida, num outro universo onde terá tudo aquilo que acha ter direito (quanta arrogancia nao). porque achamos nos (ser humano) que temos direito a ter algo mais que a vida? como podemos nos achar que a vida, viver, não é a derradeira recompensa? como podemos nós achar que estamos destinados a ser superiores à própria vida e ao próprio tempo?
    é por causa destas distorções da nossa essência da nossa realidade que volto a dizer, as religiões deviam ser abolidas já que constiutem o maior entrave ao desenvolvimento espiritual do ser humano. sao as maiores e mais fantasiosas histórias da carochinha alguma vez contadas e usadas para nos aprisionar, por homens sedentos de poder e controlo....


    and Cirrus's back!!!!!!! :D

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  4. e mais uma vez desculpa os erros. :)
    isto de escrever a correr.... :)

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  5. e que fizeste no blog que quando carrego no titulo nao vai para a pagina inicial do mesmo? tenho que estar a sair e entrar outra vez no teu sitio...

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  6. Ana, o Tempo, dizem, é relativo. Eu não concordo Eu penso que o Tempo relativiza a nossa visão dele próprio, pela sua magnitude e poder, mas no fundo, o Tempo é um valor absoluto, ao contrário do Espaço. O espaço contrai-se e expande-se continuamente, já existiu numa fase primordial superdensa, agora existe como o vemos, amanhã poderá não existir. Mas aí está, sempre ao longo do Tempo. Ou seja, o Tempo sempre existiu e sempre existirá. É ele a constante, é ele quem verá os mundos aparecerem e desaparecerem, é ele quem proporciona todas as condições para que a matéria se combine e forme seja o que for. Logo, nessa acepção, mesmo que o espaço cesse de existir, o Tempo nunca o poderá fazer, embora nessa altura ele deixe de ser concreto e absoluto para ser apenas uma linha de seguimento, a partir da qual se criará novo espaço. O Tempo é verdadeiramente eterno, e será nessa dimensão que o Homem não cabe. Aliás, nem percebe. E assim nasce o conceito de Deus, o relativizar de uma ideia absoluta que é o Tempo.

    Estou de volta? A ver vamos...

    Não fiz nada, comigo funciona perfeitamente!...

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  7. Muito interessante esta teoria Tempo=Deus...
    Nunca pensei numa possível interligação entre os dois conceitos.
    Sempre os vi como coisas perfeitamente distintas, o Tempo como algo real e Deus como algo abstracto, nunca me passaria pela cabeça juntá-los...

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  8. O tempo é a força mais poderosa que nos atravessa...

    Eu partilho da teoria do mestre relojoeiro que tudo governa, mas continuo a achar que somos germes em lamela...

    Abraço

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  9. Pronúncia, partindo do princípio lógico que Deus foi criado pelo Homem e não o contrário, parece-me que, ao contrário do que se diz, Deus não foi criado à imagem do Homem, mas sim à imagem do Tempo, pois partilha quase todas as caractrísticas deste... É o que penso.

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  10. LBJ, exactamente o que penso, e os germes na lamela são arrogantes como tudo...

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  11. Adorei a forma de olhar para o assunto abordado. E assim sendo, parece que somos todos obrigatoriamente religiosos:P

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  12. ADEK, talvez pelo contrário, diria eu. O Tempo é uma constante da vida, não uma religião. Parece é que as religiões e o próprio Deus foi criado à imagem do Tempo.

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  13. Ui, ui, ui... Se os fanáticos religiosos descobrem este cantinho... :)

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  14. Bom dia!
    Nao vou comentar este texto. Estou de ferias :-)

    Passei a deixar-te um abraco

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  15. Boa noite Francisco!

    Um abraço!

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  16. CIRRUS: que é feito de ti?
    Trabalho, férias... ou foste comprar os livros?...O tema TEMPO- DEUS suscita-me tantas preocupações , que as vou guardar para mim, para já...
    Boas festas, Cirrus.
    Um beijo de amizade da Lusibero

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  17. Maria, um pouco de tudo. Estive a gozar um período de férias pelas Serra de Sintra e depois voltou o trabalho em força, com os balanços de final de ano, resultados, etc... Eu compro sempre livros. Principalmente quando as viagens de Alfa terminam no Oriente.

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  18. Texto muito interessante. Parabéns.

    O tempo é a noção que os filósofos denominam de noção " pura e difícil" ( por estas terras ).

    Mas qual a relação entre tempo e duração ?

    E a percepção da duração ?

    E o zéro ? O que fazer do zéro ?

    Excluí-lo do tempo ?

    Não sei.

    Gostei muito do texto.

    E Viva o Porto !

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  19. PortoMaravilha,

    Agradeço os elogios, e apraz-me que tenha achado bom o texto.

    As suas questões são pertinentes e de resposta difícil. Talvez um destes dias discorra sobre elas. Mas para isso, tenho de começar a escrever. As ideias só me ocorrem quando começo a escrever.

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