quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

CALCOLÍTICO NA ESTREMADURA

Povoado de Leceia, site da CM Oeiras

    Ao fazer-se uma análise ao Calcolítico na Estremadura, está provavelmente a fazer-se, igualmente, uma análise ao Calcolítico em território português, uma vez que os principais povoados representativos desta época estão localizados nesta região. São eles Leceia (Oeiras), Vila Nova de S.Pedro (Azambuja) e Zambujal (Torres Vedras)i.
Leceia é um povoado fortificado, com ocupação confirmada em pelo menos quatro fases de ocupação, que se estendem desde o Neolítico Final (3000 a.C) até ao Calcolítico Final (embora se admita ter sido abandonado em 2300 a.C.), ocupação que confirma a existência de uma economia agro-pastoril herdada do Neolítico Final. Localiza-se numa vertente da Ribeira de Barcarena, no concelho de Oeirasii. Nessa vertente foram encontrados indícios seguros de actividade agrícola, nomeadamente o cultivo de gramíneas e cereais, mesmo durante o curto período de abandono do povoado, ocorrido na transição do Neolítico Final para o Calcolítico Inicialiii.
Vila Nova de S.Pedro é, igualmente, um povoado calcolítico fortificado, com uma arquitectura bastante peculiar – núcleo rodeado por duas cinturas de muralhas - localizado entre o vale do Tejo e o mar, perto da Ribeira de Almoster. Este local proporcionou um enorme número e variedade de espólios líticos, cerâmicos, ósseos e metálicos. Trata-se de um povoado que beneficia de óbvias defesas naturais, tanto da sua população humana como de espécies cinegéticas, que constituiriam parte da sua economia. Por outro lado, a irrigação cíclica, efectuada pelas cheias dos cursos de água vizinhos, proporcionava igualmente excelentes condições para a agricultura e pastorícia. Igualmente relevante seria a existência, não longe, de importantes depósitos de matérias primas, particularmente para as cerâmicas. No que concerne a espólio, há a distinguir três fases distintas, segundo Savory. E se aqui se explanam as fases de VN S.Pedro, há que estender estas fases às outras estações referidas, já que são, de alguma forma, análogas. A fase I é caracterizada pelos copos de decoração canelada pouco profunda, assim como por pesos de tear, ídolos e pontas de sílex grosseiras. A fase II, por seu turno, é identificada pela presença de pontas de seta elaboradas, bem como vestígios de actividade metalúrgica, embora sem cerâmica com o mesmo valor que se encontrou na fase I. Esta fase é contemporânea da construção dos bastiões do povoado e é frequentemente referenciada com Los Millares. A fase III, finalmente, deriva do aparecimento de vasos com decoração em folha de acácia para a cerâmica campaniforme, e está intimamente ligada ao colapso da fortificação central em VN S.Pedro. As escavações em Leceia podem de facto confirmar a antiguidade dos copos caneladosiv, que conviveram num curto período com as decorações “folha de acácia”, sendo que a sua forma característica parece ter persistido até ao Calcolítico Plenov. Como se vê, Leceia é sempre uma referência a acompanhar.
O Zambujal é mais um exemplo de povoado calcolítico fortificado, localizado no concelho de Torres Vedras. Particularmente relevante no Zambujal é o facto de se terem encontrado, na sala V do casal anexo ao povoado, evidências da passagem da metalurgia do cobre à do bronze, uma vez que as percentagens de estanho nos objectos ali recolhidos são bastante elevadas. Daqui podemos concluir que houve realmente um desenvolvimento metalúrgico nas sociedades agro-pastoris do III milénio a.C.vi.
Interessante será referir igualmente um outro povoado fortificado de grande importância, o de Outeiro Redondo, localizado em Sesimbra. É um pequeno povoado com duas cinturas de muralhas e com bastiões semi-circulares que, devido á sua localização, domina a baía de Sesimbra. O espólio ali recolhido demonstra vários tipos de indústria, desde a pedra lascada (pontas de seta, lamelas, lâminas, etc.), passando pela indústria da pedra polida (machados), pedra aperfeiçoada (peça identificada como peso de rede, particularmente interessante pela sua correlação com achados em Leceia), metálica (lingotes – indicando transformação local de matéria-prima “importada”, à semelhança dos lingotes encontrados em Leceia, que indicam claramente a circulação regional desta matéria-prima), óssea (furadores, agulhas, sovelas – mais uma vez em linha com os achados em Leceia – e mesmo recipientes – como os igualmente encontrados em VN S.Pedro), e a cerâmica.
A cerâmica de Outeiro Redondo constitui, mais uma vez, uma indicação segura da cronologia calcolítica. Os copos canelados e afins aparecem e é de referir o paralelismo óbvio com VN S.Pedro (Fase I), Zambujal e Leceia (Camada 3, segunda fase cultural), com a ocorrência destes copos canelados antes da construção das fortificações genericamente em todos estes sítios calcolíticos, datando do Calcolítico Inicial. A ocorrência, em Outeiro Redondo, de decorações “folha de acácia” ou crucíferas, do Calcolítico Pleno, é pouco expressiva. Por outro lado, dá-se ocorrência de decoração denteada, paralelamente aos exemplares recolhidos em Leceia, que correspondem à camada quatro deste local, e é característica do Neolítico Final, muito embora pudesse ter persistido até ao Calcolítico Inicial. Já a ocorrência da cerâmica campaniforme, do Calcolítico Final, é pouco expressivavii.
A razão pela qual se entendeu incluir o Outeiro Redondo nesta relação, além de servir de ilustração do espólio, não só deste local como de Leceia, que continua a ser a referência maior no panorama do Calcolítico Estremenho, prende-se com algumas particularidades exploradas de seguida. De facto, Outeiro Redondo é um local que evidencia que a evolução dos povoados calcolíticos não obedecia apenas a uma tendência generalizada, antes estando extremamente dependente dos condicionalismos locais. Por exemplo, em Outeiro Redondo não se encontraram cinchos, utensílios cerâmicos associados ao fabrico de queijo. Parece não ter sido a transformação do leite uma actividade económica de peso, ao contrário do que acontecia no estuário do Tejo, nomeadamente em Leceia. Os elementos ligados a teares encontrados são um exemplo acabado da “Revolução dos Produtos Secundários”, simultaneamente revelando a importância dos textêis nesta comunidade. Dados alguns achados de cerâmica de grandes dimensões, é de crer que este povoado teria como principal actividade económica a produção de sal e, provavelmente, de pescado seco. Mas relembra-se que foram encontrados lingotes de cobre, possivelmente para transformação. Ou seja, são indícios de que os povoados calcolíticos, longe de pertencerem a uma mesma entidade cultural entre si, formavam uma rede de relações “comerciais” (entre aspas para diferenciar do sentido mais moderno da palavra), em que as condicionantes locais eram ainda muito fortesviii.
E aqui caberia, de alguma forma, a questão da colonização. Existiu ou não? Foi ou não um factor determinante para a evolução destes povoados? E quem seriam esses colonizadores? Há quem creia que os povoados foram resultado de uma rede de povoamento, estabelecida por feitorias, oriunda do Mediterrâneo Orientalix. No entanto, e visto que as assimetrias locais ficaram bem vincadas entre os diversos povoados, é aceitável que se considere, conjuntamente, que a evolução dos mesmos tenha sido fruto das condicionantes geográficas e do trabalho autóctone, para além da colonização - sempre indirectax.
iCardoso, Pré-História de Portugal, 2007
iihttp://www.tecnet.pt/portugal/ref/27947.html
iiiCardoso, Pré-História de Portugal, 2007
ivCardoso, 1997
vFerreira, Sónia, Os copos no povoado calcolítico de Vila Nova de S.Pedro, Revista Portuguesa de Arqueologia, vol.6, nº2, 2003
viSousa, Valério e Araújo, Metalurgia Antiga do Penedo do Lexim: Calcolítico e Idade do Bronze, Revista Portuguesa de Arqueologia, vol.7, nº2, 2004
viiCardoso, Espólios do Povoado Calcolítico Fortificado de Outeiro Redondo, Revista Portuguesa de Arqueologia, vol.12, nº1, 2009
viiiIdem;
ixLucas, Maria Miguel, As regiões de “Torres” e “Alenquer” no contexto do Calcolítico da Estremadura Portuguesa, 1994
xCardoso, Pré-História de Portugal, 2007

10 comentários:

  1. Viva o copy-paste

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  2. Tuvalu, publico os trabalhos que faço para a Licenciatura em História. Não é copy.paste, é de minha autoria. Se se sente incomodado, pode ir dar uma voltinha ao bilhar grande. De qualquer das formas, só faço isto precisamente para que abjectos como o senhor não me façam copy-paste. Percebeu, sua besta?

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  3. Percebi, arqueólogo falhado.

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  4. Até posso vir a sê-lo, quem sabe? Como não tem nada a ver com a minha vida profissional e é apenas um gosto que tenho na vida - estudar História - posso dar-me a esse luxo.

    O meu caro amigo, que pensa que os outros não conseguem escrever nada por si, pode dar-se a esse luxo também? Compre uma vida, assim não vai longe.

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  5. Olha! Tens um Tuvalu!! :P
    Pois eu quero agradecer-te a partilha! Obrigada! :))

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  6. Malena, pois tenho... às vezes calha... Não têm mais nada que fazer senão chatear quem faz algo da vida...
    De nada!

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  7. Quem faz algo da vida, diz ele.
    Vulgar...

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  8. Vulgar, de facto. Mas verdadeiro. Não tenho vergonha do trabalho. Teria mais vergonha de insultar gratuitamente os outros, como fez.

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  9. Tu dás é trabalho... não era mais fácil dizeres "Idade do Cobre na Estremadura"?!

    Aprendi umas coisas...

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  10. Pronúncia, é exactamente a mesma coisa... Mas Calcolítico é mais giro. A ideia não foi minha, como imaginas.

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